Harry Hole é um dos mais interessantes e entusiasmantes personagens dos policiais contemporâneos. Jo Nesbo, seu criador, além de um dos autores mais completos e competentes das últimas duas décadas, tem o condão de aliar uma ímpar mestria de criar thrillers à construção de ambientes envoltos de um negrume típico das sociedades modernas.
Estas são algumas das razões para abraçar “O Fantasma” (D. Quixote, 2015) com a habitual paixão que qualquer fã de um bom policial, nórdico ou não, habitualmente dedica às criações nascidas da mente do autor norueguês.
Ao nono episódio (note-se que a editora D. Quixote tem apresentado os tomos da saga Harry Hole não necessariamente por ordem cronológica, sendo que “Cockroaches”, segundo capítulo da colecção, tem edição portuguesa prevista para o próximo mês), Nesbo faz regressar o ex-polícia à sua Oslo depois de uma passagem por Hong Kong.
Hoje, envergando uma atroz cicatriz na face e com um dedo de titânio, o antigo inspetor enfrenta mais uma terrível provação que o leva a reviver dramas e tramas do passado. Inesperadamente, Oleg, filho de Rakel, é preso. A principal acusação coloca o jovem na pele do principal suspeito de um homicídio. Hole recusa a aceitar a situação, pois o rapaz que ajudou a criar não encaixa no perfil do assassino, decidindo investigar por sua conta e risco todo o mal explicado processo para encontrar o verdadeiro culpado.
Ainda que os tempos de polícia sejam parte do passado, as amizades que Harry ganhou e fomentou enquanto agente da autoridade são agora os aliados “perfeitos” para desvendar este intrincado caso. Só assim poderá embrenhar-se no perigoso e escuro mundo do tráfico de droga que, por estes dias, tem como substância rainha a violin, uma poderosa e viciante forma de afastar a realidade e entrar num mundo de sonho que rapidamente se torna num pesadelo.
Entretanto o perigo espreita a cada esquina de Oslo. O rei do submundo das ruas é conhecido por Dubai, uma espécie de fantasma omnipresente que poucos viram a face mas que todos temem. Conseguirá Hole resolver mais um enigmático e perigoso puzzle?
Para encontrar a resposta resta devorar as mais de 500 páginas de “O Fantasma”, mais um excelente livro de Nesbo que traz aos escaparates uma trama terrífica, com um enredo irrepreensível e um poderoso final construído com ingredientes que misturam corrupção, assassinatos, política e um conflito de interesses egoístas que tornam as pessoas simples peões de um jogo sem regras ou tréguas, onde a confiança é um bem precioso e a traição um modo de vida.
Harry Hole, ex-polícia, ex-marido ou ex-“pai”, sente todo este negrume na pele e na sua mente redopiam verdades, mentiras e medos alimentados por memórias que crescem à boleia de vícios como o álcool, a droga e a sempre presente música.
Todos, directa ou indirectamente, são afectados pelo vício, mas o escritor norueguês aponta também o dedo a outro flagelo: a corrupção que leva políticos a querer pintar uma nova Oslo destinada ao turismo e à promoção económica, preferindo varrer outros problemas para debaixo do tapete.
Neste favorável contexto, as ruas são o palco para rixas entre gangues rivais que controlam cada esquina, cada vida à beira de ser devorada por uma qualquer ratazana (humana). Resta portanto a Hole tentar repôr uma certa justiça para conseguir salvar o nome e a honra de Oleg, seu “filho”, e hoje mais um toxicodependente que aspira por mais uma dose.
As perguntas são muitas, as dúvidas surgem a cada minuto, e Harry vai ter de lutar contra um dos mais empenhados criminosos nascidos da mente de Nesbo. Mais do que uma questão de justiça ou de honra, Harry está determinado a lutar contra o Mal a bem da verdade. Mas será que Hole é hoje um homem capaz de encarar esta verdade?
2 Commentários
Oi, boa tarde!
Adoro esse autor, mas os livros mais recentes não consegui no Brasil, vc sabe me informar se ainda vai lançar por aqui??
Obrigada!
Bom dia. Não lhe conseguimos dizer, mas pode sempre encomendar a edição portuguesa através da Dom Quixote:
http://www.dquixote.pt/pt/literatura/policial/o-fantasma/