Sob o epíteto da (quase) unanimidade, “A Louca da Casa” é o livro mais acutilante da madrilena Rosa Montero e uma referência da moderna literatura latina. Essa verdadeira ode à literatura – e aos escritores – foi responsável pelo empolar dos seguidores de Montero, leitores ávidos de bons livros que, há muito, queriam sentir, de novo, o génio literário da autora de obras como “Lágrimas de Chuva” ou “Instruções para Salvar o Mundo”.
E eis que surge “A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te” (Porto Editora, 2015), um (extraordinário) livro que nasce no seguimento de um imenso turbilhão emocional para Rosa Montero que perdeu o marido e deixou envolver-se nas memórias registadas por Marie Curie no seu diário.
Identificando pontos consonantes entre o pensamento de Curie e os seus próprios, Montero brota uma narrativa cujo universo se situa entre a memória pessoal e as recordações colectivas, através de uma peculiar análise contemporânea daquilo que se entende por dor, perda e consequente (tentativa de) superação.
Ao folhear este livro, o leitor depara-se com uma larga temática: o sexo, a vida, a morte, a ciência, o desconhecimento ou a sapiência, entre outros temas, fundem-se, unem-se, conjugam-se de forma natural e plena sob um atento olhar literário.
Essa visão globalizante faz com que leitor, obra e autora se sintam unos em “A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te”, nem que para isso seja necessário e presente ter a noção do luto, do fim. Mais do que um romance, estamos perante uma escrita (auto)biográfica cuja maior inspiração é a já referida Prémio Nobel da Física e da Química, que traça uma tangente cronológica entre dores, sentimentos e partilhas.
No cerne da questão está a fragilidade do ser humano, as suas fraquezas, os seus momentos menos bons. Estes são alguns dos mais utilizados ingredientes por Rosa Montero em “A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te” que reflecte, directamente ou não, um paralelismo entre vidas – entre Montero e Curie -, sem nunca descurar uma certa “reverência” por parte da primeira, uma admiração por uma personagem não consensual como o foi a investigadora e cientista polaca.
Aconselhável ao ser e sujeito humano, o mais recente livro de Rosa Montero é um potente tour de force, um testemunho em busca da redenção, uma revelação cruel daquilo que a realidade alheia, e própria, pode ser. O outro lado de Curie, o seu universo pessoal, é aqui revelado. O sucesso enquanto mulher da Ciência “escondia” um desequilíbrio emocional adensado no dia em que o seu marido não mais regressaria, da ânsia provocada pelo desespero de não mais (re)ver quem se ama.
Uma das particularidades mais “palpáveis” da escrita de Rosa Montero é a sua honestidade, algo que transmite boas vibrações, não se estranhando que “A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te” seja uma verdadeira seta apontada ao coração, sem género ou classificação premeditada, altamente recomendado (e emotivo) a todas as almas, sejam elas amantes ou não da prosa de Montero.
2 Commentários
É uma das primeitas autoras que li quando comecei a me interessar pela leitura adulta, mas distanciei-me dela porque os últimos livros seus que li pareceram-me algo irregulais. Agora este comentário tao bem exposto voltou a despertar em mim a curiosidade por esta escritora.
Muito bom texto, uma saudação.
Agradeço as suas palavras. Votos de boas leituras!