Zack é mais um detective vindo das terras do Norte, que surge no panorama dos policiais. Para quem este é um género maior, tendo já na sua galeria de leituras ilustres como o notável Raymond Chandler, o grande Jo Nesbo ou o saudoso Stieg Larson – e os seus heróicos detectives -, o acolhimento de um novo elemento faz sempre levantar o sobrolho – e, para alguns, mesmo uma saudação pouco calorosa.
Já estamos habituados a almas tortuosas e assombradas que se afogam em whiskey, conhaque ou cerveja enquanto perseguem o mal. Philip Marlowe não perde um bom conhaque e Harry Hole bebe cerveja de forma imparável (sem álcool nos períodos de sobriedade). No caso de Zack, o limite já está noutro plano. Não estamos só a falar de excessos para suportar a vida – em que os produtos consumidos não são vendidos ao balcão do bar mais obscuro ou da última loja de conveniência a fechar, antes comprados a dealers que tanto podem ser amigos como estranhos com esquemas engenhosos -, referimo-nos antes ao comprometimento sério da investigação/crime que tem em mãos devido à sua alienação psicotrópica.
Mons Kallentoft e Markus Lutteman, os autores suecos de “Zack” (D. Quixote, 2018), fizeram uma escolha arrojada, uma em que as contradições de Zack parecem estar instaladas em todas as zonas da sua vida: vai a festas clandestinas em velho estaleiros navais, o seu mostruário de drogas vai de coca a analgésicos/opiáceos comprados no mercado negro, foge de rusgas da polícia e o seu melhor amigo é dealer. Tudo se apresenta sombrio na sua vida: uma infância marcada pela tragédia, uma existência presente torturada e sem nada que a pacifique, relações amorosas intensas mas basicamente dominadas pelo sexo.
Até podemos aceitar e concordar com aquela máxima que considera que os limites e as fronteiras entre a sanidade e a insanidade, entre o bem e o mal, não são mais do que construções artificiais, rígidas e irrealistas. Esse mix entre as duas partes tem, porém, que apresentar alguma espécie de consistência. É como se não fosse possível ser, em simultâneo, do Sporting e do Benfica – eventualmente do Benfica e do Tondela já será aceitável. Isto para dizer que Zack está longe de convencer; ou, se preferirem, que não é um tipo – ou um livro – de confiança: não pelas suas muitas contradições, antes porque estas estão longe de seduzirem.
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