Mark Twain – pseudónimo de Samuel Langhome Clemens – foi um escritor/humorista do Oeste americano (1835-1910) que, através de um estilo popular e eivado de humor, conquistou leitores em todo o mundo, sobretudo com obras como “As Aventuras de Tom Sawyer” (1876), “O Príncipe e o Mendigo” (1880) ou “As aventuras de Huckleberry Finn” (1885).
“Um Candidato Idóneo“ (Antígona, 2017) reúne um conjunto de oito crónicas publicadas originalmente em jornais e revistas americanos (Mark Twain foi também jornalista), que encerram curtos ensaios e discursos, datados entre 1867 e 1887, que com inigualável eficácia humorística se referem sobretudo à “mediação comunicacional enquanto elemento do processo político”, para a assunção e o sucesso dos agentes políticos.
O esclarecido – e esclarecedor – prefácio de Manuel Portela sobre a presente seleção de crónicas (e discursos), aponta para a grande sagacidade do autor e o seu agudo sentido de observação jornalística, fundamental na imagem da idoneidade dos candidatos. “Este conhecimento da dinâmica política da democracia norte – americana na era da Reconstrução- designação do período que se seguiu à Guerra Civil Americana- revela-se no modo como satiriza as práticas nas campanhas eleitorais, no seio dos partidos e no interior das câmaras parlamentares”.
Parodiando os trejeitos retóricos do discurso político, (que, pasme-se, nada mudaram em 130 anos), o autor fala na primeira pessoa e, de modo corrosivo, confessa-se mesmo um honrado vira-casacas, que se demite de cargos públicos e faz uma elegia, muito pouco elogiosa por sinal, a um militante defunto de um Partido político.
Três crónicas há que se destacam: duas por serem profundamente impressivas e hilariantes, “O Fim Do Meu Cargo como Secretário do Senador” e “Falsa Elegia a um Militante Defunto”, e uma por ser profundamente filosófica, ”Coerência”.
Os textos das práticas satirizadas poderiam agrupar-se em três grandes temas – o candidato em campanha, a prática parlamentar e o sectarismo partidário -, onde Mark Twain imagina um candidato que assume de antemão todas as suas malfeitorias e vícios: “O que o país quer é um candidato que não se deixe ferir por investigações ao seu passado, para que aos inimigos do partido seja impossível desencantar uma história que não seja já de todos conhecida. Se, à partida, se souber o pior acerca de um candidato, todas as tentativas de o surpreender serão derrotadas. Eu vou entrar em jogo como um livro aberto”. Em suma, “um homem que tem por base a depravação total e que se propõe ser demoníaco até ao fim”.
“Um Candidato Idóneo” é a obra que melhor define o lado mais refractário deste autor americano, ao chamar a atenção – ainda que de forma aparentemente indirecta – para a natureza adulterada de um sistema de representação baseado na fabricação de candidatos políticos.
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