Depois de nos ter oferecido Watchers, uma história situada numa Lisboa que misturava a estética vintage com o delírio tech que Bresson já nos havia dado quando descobriu o Quinto Elemento, Luís Louro apresenta agora “Sentinel” (Asa, 2019). E, se no caso de Watchers era dada ao leitor a possibilidade de escolher o final do livro – optando entre a edição branca e vermelha -, agora a escolha recai num dos seus inícios, uma vez que nesta sequela o final é comum em ambas as versões.
Continuamos a passear em carros voadores, a apanhar eléctricos amarelos, a avistar árvores a sair dos prédios ou a ver animais selvagens em todo o lado, numa espécie de zoológico urbano onde os animais selvagens são quase de estimação.
Com o desaparecimento do sentinel original, que foi quase elevado a mártir da era digital, sucedem-se as legiões de seguidores e discípulos, numa busca incessante pelo maior número de likes, visualizações e partilhas. É então que vimos surgir o mais improvável dos sentinels que, como um Rambo carregado de esteróides, irá lançar o caos numa cidade já de si alienada.
A novidade já não será grande como foi com Watchers, mas mantém-se o tom duro com que o autor se dirige a alguns dos males que vão minando a sociedade em que vivemos: a dependência das redes sociais, o culto do like, a perda quase assumida da privacidade, num estado de coisas onde se prefere registar o momento a vivê-lo. Luís Louro toca também no tema do turismo, das cidades que são cada vez mais pólos de globalismo sem grande tempero, perdendo a essência que lhes eram dadas pelas pessoas que são quase obrigadas a ir viver longe por não conseguirem pagar rendas proibitivas.
Os desenhos são uma vez mais um mimo, numa mescla entre arquitectura, natureza e humanidade, retratada através de cores vibrantes e do traço muito característico de Luís Louro, que brinca aqui indo buscar referências a outras séries intemporais da BD e animação – além de prestar algumas homenagens, que se vão descobrindo a cada nova leitura.
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