Após vinte anos de ter sido publicado, “Palavras de Caramelo” (Kalandraka, 2022) chegou finalmente a Portugal, integrado na colecção SeteLéguas da editora Kalandraka. Trata-se de uma narrativa simples, poética, emocionante e ternurenta sobre a amizade e a resiliência, um elogio à escuta, tantas vezes desconsiderada. Escutar é a primeira etapa para compreender o outro e o que nos rodeia, para criar empatia e construir um diálogo efectivo.
Gonzalo Moure, escritor e jornalista, brinda-nos com esta narrativa real, inspirada numa viagem que fez a Smara, um dos acampamentos de refugiados onde vivem os sarauitas, no deserto argelino.
Esta é a história de Kori, um menino que “lutou contra as barreiras da surdez e aprendeu a falar com uma voz estranha, mas bela e redonda. Nunca deixou de escrever poemas”. Kori gostava de camelos, “gostava dos seus movimentos lentos, quando os homens os levavam atados com um cordel preso numa argola que lhes atravessava o nariz. Maravilhava-o a serenidade com que aguentavam o seu cativeiro nos pequenos redis”. Um dia, a tia deixou-o aproximar-se de um camelo, e é assim que nasce uma bonita amizade entre Kori e o pequeno camelo. Inspirado na cor, baptiza-o de Caramelo, pois recordava as guloseimas “que vinham embrulhadas em papelinhos brilhantes que se metiam na boca e era doce”.
Caramelo é o amigo que nunca tivera. Na escola e com a família, Kori comunica através de gestos e de movimentos dos lábios, e é com muito empenho e dedicação que aprende a ler e a escrever. Nos lábios de Caramelo inspira-se e escreve, no seu caderno, “frases bonitas, cada vez mais longas”. Todos os dias se sentava em frente de Caramelo, e “copiava os versos que julgava que ele lhe ditava ao mover os lábios, como aqueles dos camelos do ar…
Há nas nuvens camelos brancos,
Que pastam erva de algodão
E bebem nos poços do céu…
Há no sol camelos dourados,
Que bebem água
E pastam erva de fogo.”
Um dia, o rumor espalhou-se pelo bairro. A tristeza invadiu o coração de Kori e o seu choro ecoou por todo o acampamento.
As guardas, iniciais e finais, lisas, em tom de amarelo-torrado, aludem às areias douradas do deserto, mas também ao caramelo. Na capa, o leitor encontra a chave da narrativa. Ao longo do texto, o leitor será surpreendido com belíssimas ilustrações, ora de página dupla ora de página simples, que complementam e ampliam o texto. “Palavras de Caramelo” é um livro poético. Lindíssimo.
Gonzalo Moure nasceu em Valência, Espanha. Jornalista e escritor, obteve várias das principais distinções no âmbito da literatura infantil e juvenil: Prémio Cervantes Chico 2017 pelo conjunto da sua obra, Gran Angular 2003, Ala Delta 2001, El Barco de Vapor 1995, Lista de Honra IBBY 1993 e 1991 ou The White Ravens, entre outras. A sua obra destaca-se pelo seu compromisso social: o povo saharaui, as bibliotecas e os biblioautocarros Bubisher, os direitos da infância, a igualdade ou o meio ambiente. A par da criação literária, faz mediação de leitura, visitando centros educativos, bibliotecas e clubes de leitura, onde também dinamiza os seus livros.
Maria Girón nasceu em Barcelona em 1983 e cresceu na Garrotxa, uma região da Catalunha, numa casa grande e muito antiga rodeada de árvores, o cenário perfeito para inventar histórias e aventuras com o seu irmão. A mãe pintava quadros e fazia esculturas, Maria sentava a seu lado a observar. Às vezes, “metia mãos à obra” e desenhava com a espontaneidade própria das crianças. Os anos passaram e aos poucos abandonou as brincadeiras e deixou de desenhar, até que se matriculou na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Barcelona. Foi então que se encontrou, de novo, com os pincéis, as tintas e com uma faceta mais criativa. Continuou os estudos em Bolonha, onde descobriu a gravura. Quando regressou a Barcelona foi estudar ilustração na Escola Llotja. Actualmente tem 15 livros publicados. O álbum ilustrado “Mi Lazarilla, Mi Capitán” recebeu o Prémio Fundação Cuatrogatos 2021.
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