“Nico fora brilhante e belo. Flores de nada serviriam.”
Há quem diga que não se devem julgar os livros pela capa, mas talvez o mesmo possa ser dito em relação aos títulos – a menos que, neste caso, sejam adeptos da ironia ou não o agarrem julgando ter de borla um empurrão emocional. Escrito por Rebecca Makkai, “Os Otimistas” (Asa, 2019) transporta-nos de volta aos anos 1980, década em que a SIDA deixou um rasto de terror que, em alguns casos, ainda provoca assombrações em muitas famílias.
O livro começa com um grupo de amigos que choram Nico, bebendo como se não houvesse amanhã e celebrando a morte como se de uma festa se tratasse, ainda que essa celebração tenha um ar forçado. Na cerimónia fúnebre apenas está apenas presente a família, uma família que, com excepção da irmã Fiona, o abandonou quando tinha quinze anos. A irmã, que Nico olhava de certa forma como mãe, tinha então onze anos.
A narrativa decorre depois a duas velocidades e tempos: logo após o funeral de Nico, seguindo os passos de Yale Tishman, que acompanhou Nico até ao final e experiencia o medo da doença e a vontade de poder ter um futuro – enquanto vai vendo a Morte ceifar sem piedade uma série de amigos; e três décadas depois, onde Fiona tenta, em Paris, reencontrar a filha que desapareceu sem deixar rasto, libertando-a de uma sensação de perda que a consome desde esses anos em que era uma outra. Pelo meio temos outras personagens maiores, cujas vidas se acabam por cruzar nestes dois saltos temporais, sempre na procura de algo parecido à redenção.
Rebecca Makkai é exemplar na forma como retrata a tragédia humana, a instalação do terror, o passado que assombra o futuro. “Primeiro, temos medo de uma coisa e, de repente, estamos com medo de tudo”, lê-se a certa altura. E é isto que as personagens de “Os Otimistas” fazem: combater o medo, uma vez que já viveram todas as provações, vivendo com a crença – ou fingindo como bons actores – de que nada de errado poderá acontecer. A haver um mantra existencial neste romance finalista do Pullitzer Prize, será talvez este: pode-se escrever por cima das coisas, mas não se pode apagá-las. Ou seja, aprendamos a viver com as cores que se vão derramando sobre a nossa folha em branco.
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