Escritor e ensaísta italiano (1896-1957), Giuseppe Tomasi de Lampedusa, duque de Palma e príncipe de Lampedusa, apenas se dedicou à escrita nos últimos anos da sua vida, no tranquilo isolamento da sua nobre propriedade sem qualquer contacto com o mundo literário de então.
O seu único romance (a verdadeira obra prima da sua vida), “Il Gattopardo” (O Leopardo), foi publicado ano e meio após a sua morte, um sucesso imediato sucesso aclamado como uma das mais importantes obras literárias do século XX e imortalizado no cinema pela extraordinária produção de Luchino Visconti, em 1963.
“Os Contos” (D. Quixote, 2017), escritos por Lampeduza em 1955, reúne os quatro únicos contos do seu legado literário, nos quais o autor privilegia uma visão subjectiva que se apropria, de forma muito pessoal, da história que conta. Uma consideração que serve sobretudo para o primeiro e mais importante texto, de carácter autobiográfico, denominado Recordações de Infância – que apenas chegam aos oito anos de idade do autor.
O livro tem ainda mais três histórias: A alegria e a lei que é um breve conto natalício, A sereia – o mais conhecido da trilogia, que fala de um velho senador da Sicília que um certo verão amou uma sereia – e Os gatinhos cegos – sobre os usos e costumes de uma família siciliana.
Importa referir que o presente volume é coligido, prefaciado e profusamente anotado por Gioacchino Lanza Tomasi, filho do escritor, que faz deste livro um verdadeiro ensaio da sua autoria e, simultaneamente, uma sentida homenagem ao Escritor e Pai.
É, aliás, o filho do escritor que na Introdução feita a Memórias de Infância, sempre com as versões originais dos textos agora publicados, se refere ao manuscrito sobre o qual trabalhou, como estando em estado magmático: “E esse rascunho é uma espécie de sonho de desejo escrito com a fúria e a incongruência do despertar, a supressão da consequencialidade temporal e a representação momentânea de pulsões emotiva, quase uma auto-análise sobre o percurso libidinoso da própria vida”.
Em Memórias de Infância existe o testemunho na primeira pessoa de recordações desde os três aos oito anos de idade de Guiuseppe Tomasi di Lampeduza: a notícia do assassínio, em 1900, do Rei Umberto I; o terramoto de Messina ocorrido de madrugada em 1908; o relato da dor da mãe do autor com a notícia da morte dos tios; a sua apresentação forçada, metido em roupa de gala; Eugénia, a ex-Imperadora dos franceses; as longas viagens, de comboio e de carruagem; a sua casa natal – Palazzo Lampeduza, que designará por “Desaparecida amada” depois de bombardeada em 1943 -, descrita com rigor através das dimensões dos aposentos, do tamanho e número dos móveis, das cores dos quadros e tapeçarias, das decorações de madeira, dos estuques e das pinturas dos compartimentos.
Surpreende o facto de a obra ser enriquecida pelas fotografias do manuscrito e pelos desenhos das sucessivas casas, feitos pela mão do próprio autor. Um grande testemunho sobre a vida – e os locais de vida – e obra do escritor.
1 Commentário
Livro maravilhoso.
O conto A Sereia é excepcional, uma jóia literária. Para sonhar com a Sicília e seus Deuses.