Continua a bom ritmo a publicação das edições triplas de One Piece, a série assinada por Eiichiro Oda que veio a transformar-se num dos maiores fenómenos mangá à escala planetária. “One Piece 3: Velhote Desgraçado” (Devir, 2023) continua a fazer da pirataria um trabalho de sonho, reunindo os volumes 7, 8 e 9 da série original: Velhote Desgraçado, Não Morrerei e Lágrimas. E é, uma vez mais, um volume imperdível, numa história que se lê como um cruzamento entre uma Ilha do Tesouro com super-poderes e a arte de contar histórias da Xerazade das Mil e Uma Noites.
“Velhote Desgraçado” traz-nos a temida chegada dos piratas de Krieg, o Rei do East Blue, num grupo onde há gente como o Pearl da Parede de Ferro, que passaria na certa vergonhas se tivesse de fazer uma análise ao sangue. Sanji, o estiloso chef, não acusa a pressão e, de cigarrinho no canto da boca, dispara – como quem corta batatas às rodelas – mantras culinários como este: “A faca é o espírito do cozinheiro. Não deve ser conspurcada por um amador qualquer”. Sanji recusa abandonar o navio-restaurante para não dar cabo, palavras suas, do “tesouro do velhote”, que nem com este gesto altruista deixa de tratar Senji como o mini-beringela. Recuamos aos tempos em que, com 10 anos, Sanji era aprendiz de cozinheiro, contando-se a história de como o capitão perdeu a sua perna – e de como este e Sanji acabaram por partilhar, em surdina, um sonho. No tempo presente, a batalha no navio está ao rubro. Como uma velha bruxa diante do espelho, Krieg vai perguntando se há algum rei dos piratas melhor do que ele, assistindo do camarote a uma luta acesa entre Sanji e o seu lacaio Gin, que se verá “atrapalhado pela compaixão”.
Depois do veneno, a vingança. Poderia bem ser a frase de lançamento de “Não Morrerei”, onde é agora Luffy a chegar-se à frente num combate que parece estar perdido desde o início para os bons da fita. Espinhos, sangue e um duelo com Krieg fazem parte do programa de festas deste 8º volume, assim como gás venenoso, espigões e uma lança que explode a cada ataque – segundo um exausto Luffy, é apenas “um pau que explode”. Não faltam por aqui bravos ensinamentos, como este deixado pelo capitão perneta antes dos piratas improváveis se fazerem finalmente ao mar: “Nas batalhas de vida ou de morte entre piratas, aquele que teme a morte, mesmo que seja por um instante, perde facilmente”.
É também neste volume que se aprende que a Grand Line se chama Cemitério de Piratas por ser dominada por três grandes poderes, sendo um deles os Sete Grandes Corsários. O pior deles dá pelo nome de Jinbe, o chefe dos piratas homens-peixe, mas a rota de Luffy e companhia faz-se através de Arlong Park, uma região controlada por Arlong, um homem-peixe que rivaliza em crueldade com o Jinbe – e que dizem ser mais poderoso que Krieg. Arlong, de alguma forma, está ligado a Nami, a ladra de piratas que detesta piratas e se tornou um deles, e que aqui veremos para além da armadura de ferro que construiu como um escudo emocional – uma história extraordinária, mais uma. Também o sempre galifão capitão Usopp estará em grande neste volume, apesar de virar as costas à luta sempre que a ocasião o permite.
“Lágrimas”, o derradeiro volume deste terceiro número de One Piece, revela o desejo de Arlong de criar o seu próprio país, transformando East Blue no império dos Homens-Peixe. Najiko, a destemida meia-irmã de Nami, entra também em cena, mas é Nami que esconde um plano secreto, feito de um altruísmo que só ela conhece. Tudo se irá jogar entre a Aldeia do Coqueiro e Arlong Park, num crescendo onde veremos a chegada da marinha, Luffy a precisar do seu sono de beleza nas situações mais delicadas ou a história de Bellomere, a mão adoptiva de Nami e Nojiko. O final, com Luffy literalmente à porta do império de Arlong, deixará o leitor com o vazio de não ter ainda nas mãos o quarto volume, que promete uma ida ao fundo do mar e muito, mesmo muito altruísmo.
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