“Este talvez seja um livro triste – e as pessoas, sobretudo quando se trata de livros que também são para crianças, quase sempre preferem livros felizes, esperançosos”. Esta frase de contracapa, uma derivação poética do que normalmente surge nos maços de tabaco ou em rótulos de vinho apelando à moderação, não deverá dissuadir os mais crescidos de levarem para casa, como prenda para os mais pequenos, o álbum “O Ponto em que Estamos” (Planeta Tangerina, 2023).
Assinado pela dupla Isabel Minhós Martins e Bernardo P. Carvalho, que têm estado ao nível da dupla Jorge Costa/Ricardo Carvalho na grande final europeia de 2004, este álbum faz um balanço ilustrado, de forma poética e brincando com a linguagem, do estado do mundo, e dos muitos desafios que enfrentamos para que não precisemos de ir, daqui a uns anos, viver numa estação espacial – existam então vôos e lugares.
A partir de expressões como “montanhas de saldos” ou “enxames de carregadores avariados”, somos confrontados com a oposição entre o natural e o humano, entendido como o capitalismo desenfreado, os crimes ecológicos (como os derrames petrolíferos) ou os cruzeiros que, de forma breve, trazem consigo uma destruição condensada aos portos e cidades que visitam com a brevidade de um relâmpago.
Com ilustrações inventivas, onde sentimos o peso dos lápis de cor e as arestas dos recortes, observamos o lixo nos oceanos, o betão a exterminar os espaços verdes, a extinção dos animais (e o seu choro), o aquecimento global, o domínio do carro sobre as pessoas nas cidades, o entupimento do tráfego aéreo, o consumismo desenfreado, o desperdício alimentar ou a luz artificial que nos impede de ver as estrelas. Uma carta poética para os activistas de amanhã (e, quem sabe, para os adultos de hoje).
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