Lembram-se de Macaulay Carson Culkin, que ficou eternamente conhecido como o puto do Sozinho em Casa e que, depois de um estrelato precoce, viveu anos e anos de travessia no deserto? Pois bem, o suíço Joël Dicker não deve correr o risco de ficar trancado em casa dos pais ou de viver o drama da página em branco, mas a verdade é que, no que toca à boa prosa, arrisca-se a ficar conhecido como aquele tipo que escreveu “A verdade sobre o caso Harry Quebert”, livro que juntava a intriga policial a um espírito literário light extremamente viciante.
A mais recente aventura de Dicker dá pelo nome de “O enigma do quarto 622” (Alfaguara, 2020), um cruzamento entre a guerrilha de escritório da série Suits e a trama intrincada ao ponto do nó cego de uma novela mexicana, onde o próprio Dicker surge como falsa personagem central. Alguém que, escapando a uma relação amorosa mal resolvida e ao desgosto de ter perdido o seu grande editor e amigo, irá procurar descanso e sopas no Palácio de Verbier, um hotel de prestígio nos Alpes suíços, apenas para se ver envolvido na resolução de um homicídio ocorrido quinze anos antes, que obrigou a que o número do quarto 622 fosse suprimido e desse origem a dois 621.
Viajando entre diversas linhas temporais, Dicker monta este policial à volta de um triângulo amoroso, insuflado e minado pela ambição e pela inveja, com tantas camadas que daria para enfrentar o Inverno para lá da Muralha e do exército dos mortos, deixando para a recta final o desvendar de uma das primeiras frases do livro – “Havia um cadáver estendido na alcatifa do quarto 622” -, tanto no que toca à vítima como ao assassino.
Com um pouco menos de cordel, Dicker poderia bem ter construído um romance de espionagem ao estilo do mais inspirado Le Carré, já que a trama está toda lá. Mesmo apesar de alguns erros de palmatória, como um amante enviar flores para casa da amada com cartões assinados ou um agente secreto pagar despesas não autorizadas – e supostamente secretas – com o cartão da empresa. Ficou-se assim por um policial carregado de mel, onde a boa da investigação se vê esmagada por um camião TIR com demasiadas Sabrinas e revistas cor-de-rosa lá dentro.
Sem Comentários