“O Coração e a Garrafa” | Oliver Jeffers

São já doze(!) os livros de Oliver Jeffers que integram o catálogo da colecção Orfeu Mini e, se tivéssemos de escolher uma palavra comum a todos eles, ela poderia bem ser esta: deslumbramento. Com uma capacidade inventiva que passa pela escrita e, sobretudo, pela forma como faz uso de várias técnicas, estilos e materiais nas suas ilustrações, Jeffers é um dos grandes ilustradores mundiais ao serviço do universo infanto-juvenil – e, há que dizê-lo, do mundo dos adultos.

“O Coração e a Garrafa” (Orfeu Negro, 2020 – reedição) conta a história de “uma menina, não muito diferente das outras, que queria saber tudo o que havia para saber acerca do mundo”. A sua vida corria sobre rodas, com cada dia a ameaçar ser melhor do que o anterior, até que se depara com uma cadeira vazia.

A partir desse dia, decide guardar o seu coração numa garrafa, um sítio seguro que parece conseguir sugar o vazio que a preenche. Porém, esse desprendimento acaba, igualmente, por fazê-la perder o apreço por tudo o que é belo, seja o brilho das estrelas ou a contemplação do mar e do horizonte.

De forma subtil, Oliver Jeffers leva os mais pequenos a olhar para a perda, num livro que ensina a aprender com os outros, a aceitar a dor e a perpetuar a memória, o último reduto onde guardamos aqueles que deixaram marca na nossa existência.

O livro é todo ele Jeffers, seja nos tons e na paleta de cores escolhidos, na profusão de texturas, na forma alternativa como nos mostra os pensamentos através de balões que vão da ilustração científica ao desenho espacial. No uso superfícies rugosas, que tanto parecem a tela de um quadro clássico de uma galeria como uma folha em branco pronta a ser inventada. Ou no modo de desenhar personagens sem pés ou sem boca, mantendo ainda assim um grau intenso de humanidade. Qualquer coisa como o Francis Bacon da ilustração, que aqui nos faz um desenho do sempre complicado coração humano.