“A ilha no meio do oceano mar”. É com este verso disfarçado de prosa que Teresa Canto Noronha, que nos habituámos a ver no pequeno ecrã, nos descreve o coração de uma das mais bonitas ilhas do mundo, num livro de memórias vivas que se lê como um guia de viagem sentimental a usar na primeira ou na próxima visita aos Açores. Isto porque, quem vai aos Açores, deseja que haja sempre uma próxima vez.
Nascida na cidade de Ponta Delgada, nos Açores, Teresa Canto Noronha tornou-se jornalista em 1989, tendo trabalhado na RTP e, desde 2006, na SIC. Em Março de 2017 criou uma página de facebook, em formato de blogue, com crónicas e textos sobre as vivências na ilha de São Miguel e fora dela, percorrendo a infância e a adolescência passadas no meio do oceano mar e, também, a idade adulta, tempo onde foi apertando a saudade de um lugar onde “aquele verde da erva, aquele preto das pedras, e aquele azul do oceano são únicos”. Textos que foram reunidos em “Notas da Ilha” (Letras Lavadas, 2019) onde, com humor e um forte sentimento de pertença, a autora revela um olhar apurado da interacção humana, do mundo em redor e das relações que o fazem girar.
É, como Nuno Costa Santos escreve no prefácio, “um cativante exercício de memória e de actualização dessa memória desenhado em modo directo e curto”, “um modo de respirar” que nos abre a porta para o mundo no qual cresceu Teresa Canto Noronha, apresentando-nos aos seus heróis, a alguns dos seus gostos e particularidades – como considerar-se uma flor de estufa mas adorar correntes de ar – e à forma com esta “ilha no meio do oceano mar” se tornou indissociável da sua forma de estar e pensar. Uma terra que não sai de dentro de quem lá nasceu e, arriscamos, de quem a visita.
Na companhia de Teresa bebemos uma Kima, que ajuda a empurrar uma deliciosa queijada da vila; assistimos ao pôr-do-sol no Tukátulá, em Santa Bárbara; ficamos com vontade de comer uma malassada, umas freirinhas – pipocas – ou, quem sabe, de trocar o café pelo chá Gorreana.
“Notas da Ilha” é, também, um tributo a uma família e às suas tradições, uma família feita de mulheres com “pêlo na venta”, em textos onde descobrimos uma homenagem a um pai – “a ele devo toda a insularidade que há em mim” -, à avó paterna – “a senhora que mais admirei e que é, tantos anos depois da sua morte, a maior referência da minha vida” – e à casa onde a autora teve a sorte de crescer – “daquela casa e daquela infância trouxe quase tudo de quem sou”.
Teresa recupera os seus tempos de escola, mostra adoração pelas procissões, orgulho nas bandas filarmónicas e um fascínio pelos aeroportos – “zoos humanos onde podia passar grande parte da minha vida” -, sempre com um sotaque que nos faz ter vontade de ouvir estes textos em voz alta. Um livro de reminiscências insulares que nos mostra a importância da memória e a beleza das tradições familiares. Quando forem a São Miguel, levem neste livro e façam dele o o vosso Lonely Planet.
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