Assina no BI com um muito respeitável Adolfo Morais de Macedo, licenciado em Direito, em tempos advogado praticante e, por estes dias, consultor jurídico. Mas foi com o muito literário nome de Adolfo Luxúria Canibal que inscreveu o seu nome na história da música nacional, liderando um grupo cujo nome serve, há já várias gerações, para iniciar uma lengalenga infantil que, normalmente, acaba ao estalo: Mão Morta.
Pelo caminho, criou espectáculos de spoken word – em nome próprio ou como Estilhaços – e integrou o colectivo de música electrónica Mécanosphere. Junte-se também a isto musicais, performances, instalações ou presenças em séries, curtas ou peças de teatro como actor e, musicalmente falando, mais de trinta rodelas gravadas, e teremos um apreciável CV.
No que à literatura diz respeito, é autor de livros como “Rock & Roll”, “Estilhaços”, “Todas as Ruas do Mundo”, “Garatujos do Minho” ou o livro-objecto “Desenho Diacrónico” – este último com Fernando Lemos. Mais recentemente, chegou às livrarias, num azul eléctrico que faz pendant com o título, “No rasto dos duendes eléctricos” (Porto Editora, 2019), que reúne, entre poemas e canções, a sua poesia num espaço temporal de quatro décadas, de 1978 a 2018.
Sem direito a qualquer introdução – mais punk que isto é impossível -, somos trespassados, logo de entrada, por um Manifesto escrito pelo punho de Adolfo em 1982, onde a certa altura se lê isto: “Parem de grunhir porcos! Oh irónicas ironias dos nossos heróis! Queremos cânticos rudes das nossas trágicas proezas”. Qualquer coisa como poesia em estado de rock n` roll ou, se professarmos a fé de Valter Hugo Mãe expressa numa das guardas do livro, palavras para serem bebidas “sobretudo como contracultura, oposição à padronização ou higienização social”.
Acima de tudo, mora aqui uma poesia sem moralismo, com um travo extra de acidez, uma propensão para o belicismo, uma paixão pelo grotesco e um fascínio pela alucinação. Aqui descobrimos Adolfo Luxúria Canibal como o nosso Lautréamont de Braga, o Marquês de Sade de toda a zona norte do país.
Revisitam-se letras de canções tão clássicas quanto “Maria, Oh Maria”, “Charles Manson” ou “O Divino Marquês”, e só é pena, para que a luxúria ficasse no ponto, que esta bonita edição não tenha vindo com um CD de declamações em nome próprio.
Sem Comentários