Bom entretenimento, de digestão fácil e sem contra-indicações. Avança-se deste modo pelo livro “Na escuridão” (HaperCollins, 2016), da norte-americana Faye Kellerman. O efeito placebo, a existir, decorre da narrativa límpida, desprovida de emproamento, hábil na captura do leitor, ao bom estilo das séries policiais perante as quais se anseia conhecer o desfecho do mistério.
Encontramos uma estrutura fechada com uma única história, um enredo principal complementado com algumas meadas secundárias relacionadas com a vida pessoal do protagonista, o inspector-coordenador Peter Decker, do Departamento de Polícia de Los Angeles.
A acção começa com a descoberta do crime, um múltiplo homicídio ocorrido no seio de uma família bilionária, os Kaffey, responsáveis por vários investimentos e empresas. Acabam assassinados no luxuoso rancho de que eram proprietários, guardado por inúmeros seguranças privados, alguns dos quais reabilitados dos principais gangs de marginais da região. O que levaria Guy Kaffey a contratar ex-delinquentes? Solidariedade ou avareza?
Perter Decker e os seus investigadores rapidamente se apercebem de que os homicídios teriam que ser obra de alguém próximo ou da família. O crime é investigado, são processadas evidências, interrogados suspeitos e, bem no final, descobre-se a trama e os seus responsáveis, autores materiais e morais. Garante-se assim a intriga e o fascínio associado ao mundo policial.
O estilo usado por Faye Kellerman corresponde a uma narrativa conduzida pelo enredo, muito factual e gradual no deslindar da questão de partida, sentindo-se algum prejuízo relativamente à caracterização psicológica das personagens. Acompanha-se e compreende-se a progressão da investigação, acontecimentos que levam a outros acontecimentos, fazendo-nos sentir próximos da equipa de investigadores e da acção no terreno.
O realismo como característica fundamental da narrativa policial está claramente presente. Os investigadores analisam as evidências, testam hipótese e, por fim, interrogam os suspeitos. No final o(s) homicida(s) é(são) descoberto(s) em razão das provas obtidas, conseguindo-se, com tal estrutura, manter o interesse do início ao fim, ficando entreaberta a porta para a fase seguinte: a próxima trama com o mesmo protagonista, o inspetor-coordenador Peter Decker.
“Na escuridão” permite ainda uma viagem por vários mundos, cumprindo uma outra função da literatura policial, para além do entretenimento: a de ser uma oportunidade de reflexão sobre justiça e ética na sociedade, polarizando menos o bem e o mal, humanizando os personagens, policias e criminosos, tendo por base o recurso a elementos no mundo real na composição da ficção.
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