Nas palavras de Anne Margaret Daniel, especialista em literatura irlandesa e americana, responsável pela edição destes dezoito textos de F. Scott Fitzgerald, estamos perante contos que se debruçam “sobre o divórcio e o desespero; dias de trabalho e noites solitárias; sobre adolescentes inteligentes que não conseguem ir para a faculdade nem encontrar emprego durante a Grande Depressão; sobre a história norte-americana, com as suas guerras, os seus horrores e as suas promessas; sobre sexo, com o subsequente casamento ou não; e sobre a luminosa vitalidade frenética e a pobreza extrema da cidade de Nova Iorque, local que Fitzgerald amava genuinamente e compreendia em todas as suas possibilidades, frivolidades e fealdade”.
Depois de um arranque fulgurante como escritor profissional na primeira década do século XX, F. Scott Fitzgerald (1896-1940) viu-se refém de uma imagem de autor retratista de uma sociedade épica e glamorosa, de que são exemplo romances de sucesso como “Este Lado do Paraíso” (1920) e “O Grande Gatsby” (1925).
Quando experimentou algo diferente, Fitzgerald deparou-se com grandes dificuldades, permanecendo refém do estereótipo inicial. Ainda assim, já na década de 30, passou um longo período dedicando-se, sem grande sucesso, apenas a textos para revistas e roteiros para filmes de Hollywood. A maioria dos contos revelaram-se sombrios, contemporâneos com a Grande Depressão nos Estados Unidos e a crescente falta de sucesso do autor, absorto pela escassez de dinheiro e a precaridade da sua própria saúde e da mulher, Zelda Fitzgerald. Enfraquecido pelo álcool, Fitzgerald tenta por duas vezes o suicídio, acabando por falecer em dezembro de 1940, aos 44 anos.
A maior parte destes dezoito contos agora reunidos e publicados tem tanto de pessoal como de descentrado, fruto de uma época marcada pela ansiedade e pelo desespero, vaivéns vertiginosos de busca de prazer e de sentido para a vida que o autor seguiu, oscilante entre o prazer e a crítica.
Artífice e protagonista implícito na maioria destes contos, F. Scott Fitzgerald retrata através destes todas as fases da sua vida e carreira: “o jovem que anda na pândega em dias e noites animado de sucesso e celebridade; o marido e pai de trinta anos, subitamente imerso num mundo de médicos e hospitais devido à doença da mulher; um homem a braços, ele próprio, com um estado de saúde debilitado, à procura de abertura desse tal novo veio da escrita; e, acima de tudo, um escritor profissional que nunca deixou de se inspirar e revigorar através da paisagem norte-americana e das personalidades que o rodeavam”.
Cada conto é, por Anne Margaret Daniel, enquadrado e precedido de informação respeitante à época e a ao estado emocional do autor no momento em que foi escrito, a forma como foi acolhido pelos editores e os cuidados que a presente publicação teve para garantir a integridade da obra e da vontade do autor.
Imagens temporárias, fragmentos de vidas, excertos de cenas do quotidiano e de uma época. Muito amor, lucidez, loucura, desespero e prazer. Muita intensidade. Uma vida ardil. Uma escrita envolvente. Vivida. Preciosa. No cômputo, “Morreria por ti e outras histórias esquecidas” (Alfaguara, 2017) é uma oportunidade de excelência para definitivamente nos ligarmos à vida e obra de F. Scott Fitzgerald.
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