O fascínio da cultura popular pelos serial killers tem sido constante, pelo menos desde que o genial Psico, de Alfred Hitchcock, nos apresentou ao perigoso Norman Bates, em 1960. Um dos exemplos mais recentes é a série da Netflix Mindhunter, produzida por David Fincher, que conta os primórdios da ciência de criar perfis criminais de assassinos em série.
O livro que serviu de base para a série chama-se também “Mindhunter” (Editorial Presença, 2018), autobiografia do analista criminal John Douglas, pioneiro deste ramo da criminologia. Douglas foi conselheiro de Jonathan Demme quando este fez O Silêncio dos Inocentes, e é a inspiração para a personagem do agente Jack Crawford nesse filme.
Encontramos em “Mindhunter” o relato da ascensão de Douglas nos patamares do FBI, e a sua ideia peregrina de entrevistar assassinos em série encarcerados para perceber como funcionam as suas mentes sinistras, usando depois esse conhecimento como arma para caçar outros assassinos em série.
Começamos por conhecer os primeiros anos de carreira do investigador, mas é quando chegamos ao seu trabalho como agente especial do FBI que o livro se torna fascinante. Há que dizer que Douglas não apresenta os assassinos como carismáticos e glamorosos, e também não os transforma em monstros unidimensionais para benefício dos leitores – é realista e descritivo ao pormenor, expressando as suas opiniões com vigor. Não esconde, por exemplo, que depois de tudo o que já viu só pode ser a favor da pena de morte.
Os assassinos em série “são pessoas que vêem a violência como afirmação pessoal ou declaração política”, afirma, “para compensarem o seu próprio desespero, o seu “pathos”, o seu fracasso e/ou falta de propósito”. Representados como vilões cativantes nos filmes, na verdade o serial killer passa por “uma pessoa normal”. Não é o visitante sinistro que chega à cidade. É, muitas vezes, aquele vizinho pacato que não chateia ninguém.
O autor coloca também a ênfase nas vítimas, e em como aquilo que o assassino viu nelas pode ajudar a descobrir a motivação por trás do crime – o que pode, por sua vez, identificar o criminoso. Os pormenores horrendos dos diversos crimes impressionam, e podem levar-nos a ver os terríveis assassinos em série como simples encarnações do Mal. No entanto, a metodologia e as técnicas desenvolvidas pela equipa de Douglas mostram que estes monstros são, na verdade, seres humanos. E é por aí que podem ser apanhados.