É uma espécie de buffet livre literário. “Manobras de Guerrilha” (Quetzal, 2018) – com o sub-título Pugilistas, Pokémons e Génios -, o mais recente livro de Bruno Vieira Amaral, é uma colecção de 26 textos, produzidos para os mais diversos meios, nos quais o autor explora alguns dos seus fascínios e obsessões.
A primeira parte, “Emboscadas”, abre com uma ode ao Barreiro (mais propriamente ao Lavradio), na pessoa de um dos seus filhos mais ilustres: o bigodudo futebolista Fernando Chalana. Segue-se uma caravana de figuras notáveis fisgadas do passado, algumas com a amplitude do mito, como David Bowie ou Mike Tyson, outras com uma dimensão humana quase trágica – escreve Bruno Vieira Amaral sobre a antiga estrela do atletismo, Fernando Mamede: “Intratável nos meetings, Mamede chegava aos grandes eventos num estado que nem o Super-Homem depois de cair num poço de kriptonite. Arrancava devagar, dava umas voltas contrariadas à pista, arrastava-se e, por fim, desistia, fugindo pela saída mais próxima”. O autor pronuncia-se sobre estes figurões com genuíno afecto, sensibilidade afinada e uma prosa dotada de um colorido muito próprio.
Na segunda parte, “Avanços no terreno”, embarcamos na companhia do escritor em direcção a destinos muito diferentes e sempre curiosos: de Goa a Budapeste, com escala na Senhora da Graça e no Mogadouro e um desvio para um safari de pokémons no Barreiro. Há episódios rocambolescos, descrições hilariantes das surreais ruas indianas, observações astutas da estranha fauna que povoa os encontros literários e uma notória destreza nas artimanhas da linguagem – Bruno Vieira Amaral ganhou vários prémios com dois extraordinários romances: “As Primeiras Coisas”, editado em 2013, que lhe valeu o Prémio Saramago, e “Hoje Estarás Comigo no Paraíso”, de 2017.
“Campo Aberto”, a terceira parte, lança alguns textos em modo sortido, onde tão depressa encaixam textos de fino recorte literário sobre Cervantes ou Susan Sontag, como reflexões profundas (salvo seja) sobre o papel do sexo anal no panorama cultural contemporâneo (“Ode ao Olho do Cu”). Não há que recear: mesmo neste tema provocador a elegância da escrita nunca se deixa resvalar para a brejeirice.
Acrescente-se então mais um epíteto a este talentoso escritor português: para além de romancista de excepção, Bruno Vieira Amaral veste-se aqui de cronista inquieto, um observador sagaz do mundo ao seu redor. E não lhe assenta nada mal o fato.
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