Quantas vezes já escutámos o som destas palavras: “Maldita Matemática” (bruaá, 2020)? Semion Pantalíkin, miúdo fantasista e sonhador que gostava de hipérboles, já o escutou por diversas vezes. Naquele dia, na aula de matemática quando o “professor ditou o problema, os alunos apontaram-no e, quando o mestre tirou o relógio e sentenciou que tinham vinte minutos para o resolver, Semion Pantalkin passou a mão borratada de tinta pela cabeça redondinha e disse para os seus botões: “Se não o resolver, é o meu fim!”” – e, talvez, tenha repetido vezes sem conta Maldita Matemática. Nos seus exageros, era hábito “ver em tudo o lado mais sombrio” e, nessa aula de matemática, quando o professor ditou o problema, não foi diferente.
O jovem Semion Pantalkin “vivia tão-somente no meio das imagens concretas”, daí a dificuldade em resolver problemas tão abstractos como aquele que o professor lhe ditou. Seria ele capaz de responder a tão grande desafio? Será a matemática apenas um conjunto de algarismos, técnicas e memorização? Claro que não! A resolução de problemas apela à criatividade e incentiva o raciocínio e o pensamento reflexivo. O jovem Semion, atemorizado e completamente perdido, dá então asas à sua imaginação em busca de respostas. Mas o tempo vai passando e, em vez de soluções, só encontra perguntas e mais perguntas.
Porque será a matemática tão amaldiçoada? Talvez não seja bem compreendida, talvez necessite de mais treino, talvez haja meninos e meninas com mais competências no pensamento divergente do que no convergente. A matemática não pode ser maldita; pelo contrário, deverá ser acarinhada e estimulada para desenvolver o gosto na aprendizagem desta disciplina, uma aprendizagem onde é imperativo respeitar os ritmos – nenhum jovem aprendiz poderá tartamudear “Não fiz … não tive tempo…”.
As guardas decorativas apresentam o motivo relativo à história que vai iniciar – a matemática. A quadrícula, invocando um caderno diário, conduz o leitor à porta da sala de aula, onde nos espera um professor sisudo e austero, traçado pelos lápis e pincéis de João Fazenda. Os tons verdes, plenos de esperança, terminam em tons mais escuros, que dão lugar ao terrível momento de enfrentar o professor e informá-lo de que o exercício não foi concluído.
Numa articulação harmoniosa entre as imagens do ilustrador e texto Arkádi Avértchenko, o leitor desfruta de um excelente livro, uma leitura para todos os que aprendem matemática, professores, pais… – para todos os leitores.
Arkádi Avértchenko foi um dos grandes satiristas russos do princípio do século XX, apelidado de rei do riso. Fundou e dirigiu a histórica revista Satiricon, onde colaboraram grandes nomes da literatura e ilustração russa. Depois da Revolução de Outubro de 1917 teve que exilar-se, passando por vários países europeus e pelos Estados Unidos da América. No entanto, a sua carreira foi curta, morrendo aos 40 e poucos anos.
João Fazenda começou muito novo a colaborar com fanzines de banda desenhada, e andava no secundário quando o seu primeiro livro de BD foi publicado. Começou a fazer ilustração para livros e jornais, acabando por se dedicar a esta área depois de terminar a licenciatura em Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Colabora regularmente na imprensa nacional e estrangeira para publicações como o Público, Visão ou o New York Times. Ilustrou livros para todas as idades, capas de livros e discos, cartazes de cinema e campanhas institucionais. Em 2015 venceu o Prémio Nacional de Ilustração.
Sem Comentários