“Cheira a Lisboa”, uma das mais famosas obras do cancioneiro popular português, foca-se no olfacto para descrever a capital do nosso país. Haverá, porém, outras maneiras de sentir Lisboa: ouça-se, nas ruas, o ruído dos eléctricos e o tilintar das chávenas de café; saboreie-se, em Belém, o mais nobre artigo de pastelaria; sinta-se, na baixa da cidade, o azulejo frio das fachadas pombalinas num dia quente de Verão; e, com o pôr do sol, aviste-se a distinta luz dourada que todas as noites abraça a capital. Tal como o hit de adulação bairrista de Amália Rodrigues, também “Lisboa em 10 Histórias” (Casa das Letras, 2022) é uma vistosa declaração de amor a Lisboa, que apela aos sentidos de alfacinhas e visitantes.
Joke Langens e Dirk Timmerman, os autores do livro, fazem um périplo temporal por alguns dos momentos mais marcantes da História da cidade e informam-nos do respectivo contexto social. Numa dezena de histórias organizadas cronologicamente, Langens e Timmerman narram vários eventos, que vão desde a tomada da cidade aos mouros, passando pela da Inquisição e as invasões napoleónicas, até ao incêndio do Chiado em ‘88.
Por entre factos históricos e curiosidades que certas vezes roçam o apócrifo, desfilam personagens de relevo como Maria Severa Onofriana, Calouste Gulbenkian, Marquês de Pombal e Siza Vieira. Sobre as artes olisiponenses (representadas pelo fado, calçada portuguesa e o activismo ambiental de Bordalo II) tecem-se louvores. Porém, é o urbanismo alfacinha que assume o papel principal na maioria destas histórias, que cobrem o terramoto de 1755, a conquista das colinas da capital pelos eléctricos e ascensores na recta final do século XIX e, mais recentemente, a ousada reordenação da frente ribeirinha do actual Parque das Nações.
“Lisboa em 10 Histórias” parece ter como principal objectivo captar a atenção dos leitores. Além da descrição de alguns do cheiros, sabores e sons da capital ao longo dos séculos, é a visão que triunfa sobre os outros sentidos — a cada segunda página de texto surge uma série de admiráveis fotografias coloridas daquela que é uma das capitais mais antigas da Europa.
Assim como a própria cidade que se propõe a retratar, o livro tem as suas imperfeições. Sobressai o minucioso trabalho de investigação dos autores, que desemboca numa escrita informada e esclarecedora, embora desprovida de brilho estilístico. Houvesse mais elegância textual e um fio condutor entre esta dezena de narrativas soltas, e “Lisboa em 10 Histórias” teria certamente potencial para ser bem mais que um bonito livro-brochura a ser ostentado numa sala de estar de um qualquer Airbnb lisboeta.
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