(Textos breves sobre livros lidos em 2020)
“Mortina e o Namorado Fantasma” | Barbara Cantini
Editora: Bertrand Editora
Terceiro livro protagonizado pela pálida e curiosa Mortina, uma morta-viva adolescente de olhos esbugalhados, que vive no Casarão Decadente com a sua régia Tia Falecida – que prepara a régua e esquadro uma festa de arromba para o Feliz Ano Defunto. Acompanhamos Mortina na sua primeira paixão por um rapaz-fantasma luminescente que perdeu a memória – e um pouco do brilho -, a não ser a recordação de que terá escapado de um buraco negro de uma árvore negra. Uma investigação sentimental onde se ouvem ensinamentos pertinentes do avô caixão e se descobre que Mortina tem um tremendo jeito para a costura.
“Caça-Olhares” | Marina Núñez e Avi Ofer
Editora: Kalandraka
Um livro que segue as mesmas preocupações expressas por André Carrilho em “A Menina com os Olhos Ocupados”, com o twist de se focar na gente grande que não tira os olhos dos ecrãs e vive num estado de pressa permanente. Afinal, quem sabe se não serão os mais novos, que herdaram este mundo tecnológico de ponta, a questionar os adultos sobre esta imensa falta de olhares. As ilustrações acompanham a vertigem humana com traços suaves e muita expressividade, simbolismo e humor.
“A Alma Perdida” | Olga Tokarczuk e Joanna Concejo
Editora: Fábula
Uma história habitada por “pessoas que correm apressadas, transpiradas e muito cansadas”, perseguidas pelas suas almas perdidas e atrasadas. O protagonista é um homem que parece viver à grande, uma ilusão que se esfuma até perder a memória, esquecer-se de quem é se remeter ao silêncio. Um livro com o ar de um álbum de fotografias antigas, algumas amarelecidas, outras vincadas, outras com pequenos vincos, onde o preto e branco ou o cinzento pálido vão aos poucos cedendo o lugar à cor. Um dos livros infanto-juvenis em formato álbum mais bonitos do ano que recupera um mantra bem importante: reduzam a velocidade e dediquem-se ao que é realmente importante.
“O Que Vamos Construir” | Oliver Jeffers
Editora: Orfeu Negro
Livro-poema do singular ilustrador Oliver Jeffers, aqui em modo de legado familiar, onde se traçam planos para um futuro comum e aquilo que deverá ser construído num mundo que não tem sabido tomar lá muito bem conta de si. Um festim de ilustração onde redescobrimos muita da obra anterior de Jeffers e que começa e termina com dois pares de mãos, que juntas constroem um novo mundo a partir de uma caixa de ferramentas desenhada de forma primorosa. Descobrimos planetas e astros, a noite e o dia, árvores e estrelas, um sítio para guardar as coisas importantes – e que poderão dar jeito mais tarde – e até um porquinho que insiste em acompanhar-nos nesta viagem visual através de um território que nos é deliciosamente familiar.
“Luzes na Floresta” | David Litchfield
Editora: Fábula
Do mesmo autor de “O Urso e o Piano” chega-nos a história de Helena, que em criança se sentou na Grande Rocha para dar livre curso às suas ideias sobre o espaço sideral e extra-terrestres que visitam a terra e levam alguns felizardos nas suas naves espaciais. Um ideia que a irá perseguir durante boa parte da sua vida, até conseguir realizar o exercício de dar valor a tudo o que foi capaz de construir durante uma vida, mostrando-lhe que aquilo com que sonhava esteve sempre na sua mão. A mistura de técnicas é primorosa e as ilustrações são magníficas, entre o mais profundo negrume e cores que parecem explodir como pequenos fogos-de-artifício, capazes de transformar uma floresta assustadora num dos locais mais belos da terra.
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