Pode dizer-se que, por estes dias, Ricardo Araújo Pereira está em todas. Da televisão aos podcasts, da coordenação de colecções de literatura humorística ao desenho de crónicas, o humorista português amealhou já capital suficiente para, se lhe desse para isso, fundar o Partido Humorista Português ou candidatar-se a Presidente da Nação – da de todos nós ou mesmo do seu Benfica, do qual se apresenta orgulhosamente como o sócio nº 12049.
“Idiotas Úteis e Inúteis” (Tinta da China, 2020), lançado no ano passado, reúne – segundo a lombada – “as crónicas de Ricardo Araújo Pereira que os portugueses nunca leram”, cada uma delas espremida em pouco mais de uma página num copo onde prima o poder de síntese, o tiro ao alvo – acertando invariavelmente na mouche – e um humor capaz de levar muito boa gente às lágrimas. Há, declaradamente, um piscar de olho ao mercado brasileiro, país com quem nos últimos anos têm sido construídas pontes literárias com trânsito a circular nos dois sentidos.
Depois de se tirar o chapéu ao chapéu, ficamos a conhecer o belo do segredo finlandês para a felicidade – “ficar em casa sozinho, a beber, em roupa interior” -, espreitamos a secção de lifestyle – ou, em bom português, o “repositório de curiosidadezinhas meio parvas encontradas na Internet, dicas de beleza e charlatanices pseudo-científicas em geral” -, caímos na armadilha das resoluções de novo ano, questionamos a higiene pessoal do 007, olhamos o casamento como a mais perigosa das burlas dos tempos modernos, aprendemos a diferença entre ser bêbado e estar bêbado, fazemos o devido manguito a Trump ou, ainda, cultivamos o marketeer que há em nós, aprendendo tudo o que há para aprender sobre a melhor forma de traficar droga na fronteira.
Há, também, textos contaminados pela Covid-19 e um olhar incendiário sobre a profusão de disparates que habitam as redes sociais deste mundo, mesmo que vindos de alguém que, em 15 anos, nunca abriu uma conta na loja do Zuckerberg, indo só lá espreitar de vez em quando – “Estou a viver à antiga, como se fosse 2003”. No que toca a crónicas, o RAP continua a ser a melhor banda-sonora.
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