“Apenas na febre da criação ela conseguia recriar a sua vida perdida”. Quando um livro começa com esta frase de Anaïs Nin, impressa a negro sobre um fundo cor-de-rosa com um diabo à espreita, espera-se sempre o melhor. O que, no caso de “Faithless: Volume Um” (G. Floy, 2020), resulta em qualquer coisa como a Divina Comédia de Dante recriada livremente pelo Marquês de Sade, a que só falta mesmo o alerta na capa de que há nestas páginas marotice para dar e vender.
A protagonista desta série assinada por Brian Azzarello (argumento) e Maria Llovet (arte) dá pelo nome de Faith, que se diverte com coisas mágicas como desenhar feitiços. O gatilho existencial surge quando Ginny, uma crente acagaçada, lança para o ar a questão: “Mas e se um desses desenhos que fazes fosse a sério?”.
Num mundo demasiado arrumado, Faith vai passando por uma excêntrica capaz de animar as hostes, mas a coisa começa a descarrilar quando conhece Poppy, alguém que tem um ex-namorado à perna e uma capacidade de sedução bem acima da média. Um jogo de cintura provavelmente herdado do Sr. Thorne, o seu pai, que mostra ter um grande fraquinho por Faith, e que mais parece um diabo desesperado por firmar um pacto, conduzindo Faith a um rápido deslumbramento pela fama e o corte com toda a sua existência até então.
Com muito erotismo e truques de magia, Brian Azzarello conduz-nos a um mundo dominado pela arte, carregado de excessos e com o coração aberto para a depravação, num primeiro volume que promete levar-nos numa viagem de auto-descoberta – e, se o Diabo deixar, de um encontro com o estranho amor. A galeria final de capas, assinada por Paul Pope, é um bom prenúncio daquilo que poderá estar a caminho.
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