Tudo começou em 2012, ano em que João Pedro Mésseder e Rachel Caiano lançaram “O Pequeno Livro das Coisas”, livro que lhe valeu o Prémio Bissaya Barreto da Literatura para a Infância e que foi, também, finalista do Prémio Autores – Melhor Livro de Literatura Infanto-Juvenil 2013, da SPA, dando início a uma série a que se seguiram “Tudo É Sempre Outra Coisa” (2013) e, mais recentemente, “De Umas Coisas Nascem Outras” (Caminho, 2016).
Era uma vez coisas que se tornaram outras, quase sempre maiores do que o haviam – ou podiam ter – sonhado: “uma semente de trigo que um dia se descobriu pão”; “um pedaço de barro que um dia se descobriu cântaro”; “uma menina que um dia se descobriu mãe”. A partir destes renascimentos e metamorfoses surgem pequenos poemas visuais, como “o musgo é o veludo que agasalha a pedra dos muros” ou “o sol é o único afogado no mar que todos os dias renasce”. Isto num livro onde a prosa tem as mesmas cores da poesia, mostrando – ainda será preciso? – que literatura infantil é isso mesmo: literatura. E, neste caso, boa literatura, onde se faz a poesia dos objectos e se enchem os instantes arrancados ao tempo de um perfume permanente.
As ilustrações de Rachel Caiano são puro deleite, primeiro com muito de preto e vermelho e traços desalinhados que habitam numa aparente imperfeição. Entra depois o azul, da água do mar mas também de uma banheira ou de uma complexa rede de metro. E rostos magníficos, que Rachel pinta de forma soberba como se fossem reflexos da alma.
O livro tem um pouco de tudo: humor – “a pantufa é a única peça de calçado que ainda não saiu da loja e já tem ar de coisa velha” -, música – “o clarinete baixo soa sempre como o instrumento mais sábio e idoso da orquestra” -, jogos de tabuleiro – “no tabuleiro do xadrez desenrola-se uma batalha silenciosa” -, animais – “porque vêem bem no escuro, os gatos não têm medo das suas próprias imaginações nocturnas, ao contrário dos homens” – e até uma corrente de ar frio – “por alturas do Natal o frio das casa toca à campainha, mas ninguém lhe abre a porta, ninguém lhe oferece uma chávena de chá quente”. Para o fim reserva-se uma interrogação mascarada de convite, juntando ao delírio e iniciação poética uma outra possibilidade que a Literatura oferece: a da releitura.
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