“O artigo que eu tinha lido sobre os amigos imaginários dizia que eles costumam aparecer em alturas de crise. Dizia também que os miúdos tendem a perdê-los quando os seus interesses amadurecem. Mas o Crenshaw dissera-me o contrário. Afirmara que os amigos imaginários nunca desaparecem. Que ficam em sentido. À espera, para o caso de serem necessários.”
Depois de, no ano passado, Katherine Appegate nos ter conquistado com a história de “O Único e Incomparável Ivan”, eis que a autora regressa às prateleiras portuguesas com mais um livro em que um animal assume papel de destaque.
“Crenshaw” (Booksmile, 2016) – com o sub-título O Grande Gato Imaginário – conta-nos a história de Jackson, um rapaz de dez anos para quem a vida nunca foi muito fácil. Os vários empregos precários que a mãe soma, a par da doença degenerativa do pai, fazem com que o dinheiro escasseie a ponto de a família não ter o que comer e ver-se obrigada a morar numa carrinha por falta de pagamento de renda.
Os pais procuram esconder os problemas de Jackson, assumindo sempre uma atitude positiva perante a vida, mas isso só faz com que a criança sofra ainda mais face ao desconhecimento da realidade. É neste contexto que surge Crenshaw, um gato gigante e imaginário, com um “sentido de oportunidade excelente”, presente sempre que a criança mais precisa.
Ainda que as circunstâncias fossem “uma boa altura para ter um amigo, mesmo que imaginário”, Jackson tem dificuldade em acreditar na existência de Crenshaw, isto porque o rapaz, que quer ser cientista, “gosta de factos e de coisas reais”. Haverá explicação científica para um gato gigante que adora gomas roxas e banhos de espuma?
Com capítulos e frases curtas e uma linguagem simples adequada à faixa etária a que o livro se propõe, o leitor é convidado a entrar em temas difíceis – como o desemprego, a fome e a falta de um teto – pelo olhar inocente de uma criança, que sente na pele a imprevisibilidade e as contrariedades da vida.
Para além da capa, por si só, nos envolver na aura de fantasia que um gato imaginário proporciona, também o grafismo do livro procura acompanhar a mensagem. A cada novo capítulo surge-nos a imagem de Crenshaw, como que a desafiar-nos pela sua simples aparição, tal como faz à personagem.
Entre a magia, as explicações lógicas e a falta delas, “Crenshaw” envolve o leitor de ternura e esperança, mostrando como a amizade, a união e a entreajuda podem fazer valer-se perante as maiores adversidades. Porque “amigo é aquele que surge no momento certo para te lembrar do que é importante”.
2 Commentários
[…] alguns lançamentos e encontrei este, chamado Crenshaw. Certamente, leria esse livro e, depois, provavelmente daria a alguém. Angela e […]
Que livro mais encantador, mostrando a fantasia e a critica de uma sociedade precária da qual infelizmente fazemos parte! Crianças não somente no Brasil mas no mundo estão passando por tragedias e a imaginação é o jeito mais doce para encarrar a vida!