Assumindo a missão de divulgar alguns dos autores nacionais de BD que caíram no esquecimento, A Seita – aqui em colaboração com a associação cultural portuense Turbina – fez chegar às livrarias “Concerto para 8 Infantes e 1 Bastardo – seguido de NiuIoRk” (A Seita, 2021), duas obras escritas e desenhadas por Fernando Relvas (1954-2017).
Concerto para 8 Infantes e 1 Bastardo foi publicado originalmente no semanário Se7e, entre 9 de Novembro de 1982 e 16 de Março de 1983, depois de ter caído a intenção original da saída na revista Métal (Hurlant) Aventure, a convite de Jean-Pierre Dionnet. Se7e que foi, igualmente, o terreno de publicação para NiuIoRk, entre 23 de Março e 29 de Junho de 1993.
Júlio Eme, que assina o prefácio a esta edição, fala de uma “combinação literária entre textos e desenhos”, algo que ressalta em Concerto para 8 Infantes e 1 Bastardo que, com um pouco mais de jogo de cintura, poderia ter caminhado na direcção de um Sin City ou de um Criminal, um policial noir que ciranda entre o Bairro Alto e o Cais de Sodré e trata por tu a noite lisboeta. Uma BD onde o estilo independente salta à vista, com desenhos acompanhados por dois estilos de lettering: um escrito à mão, ao estilo de uma fanzine caseira, e um outro saído de uma máquina de escrever antiga.
Jaca é um tipo dos subúrbios, decidido a seguir uma carreira diplomática, e que no cartão de visita poderia escrever: ribatejano e bastardo (e futuro diplomata). A verdade é que o destino não o levará por aí, antes ao reencontro, quatro anos depois, com Fred, um tipo que agora parece dedicar-se “ao comércio de coisas finas” – mas que mantém “os mesmos olhos dum castanho escuro sem fundo, o mesmo nariz de promontório, até o mesmo bigode de fooca, (…) acrescido duma mosca à Zappa, ou à Luís XIII se preferirem…”.
Sem quase se dar conta, Jaca ver-se-à metido num mundo onde há coca com fartura, fazendo de babysitter a uma estrela rock e tentando sair da frente dos Infantes, “um grupo de meninos bem com a mania que são nazis”. O mantra, no meio deste caos urbano-depressivo, parece apontar para isto: aprende a conhecer as marés para que a vida – ou os negócios – não te corra mal. Quanto a NIuIoRk , traz-nos novamente Jaca como protagonista, que aqui parece ter na vodka laranja (sem laranja) a sua bebida de eleição.
Para o final estão guardados alguns tesouros, como esboços, páginas que não chegaram a ser utilizadas, uma biografia cronológica ou um texto do próprio Fernando Relvas, que incide na história e nas técnicas de desenho, que vão das várias canetas usadas aos diferentes tipos de papel. Um livro que vale mais pelo desenho do que pelas histórias, mas que fica impresso como um documento histórico que resultou de uma imensa dedicação da editora, entre pranchas originais e recortes de jornal.
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