Publicado originalmente em 2017 com o prestigiado selo da Casterman, “Bug 1” (Arte de Autor, 2018) é o primeiro volume da mais recente série assinada – e desenhada – pelo veterano Enki Bilal, que respira ficção científica por todos os poros.
Estamos em Paris, ano de 2041, onde tem lugar um bug generalizado, ao estilo daquilo que Fincher inventou no seu Clube de Combate (ainda que, aqui, as razões sejam menos nobres): “um tsunami informático parece ter esvaziado os conteúdos de toda a rede digital conhecida”. 14 países decretaram já a mobilização geral, num cenário que recua aos tempos da Guerra Fria, onde a electricidade já era e que pode bem levar ao regresso do papel, da caneta e à memória do cérebro sem cábulas num mundo cada vez mais dependente da tecnologia. Há quem defenda que este será o resultado de “uma ideia pervertida do progresso e de um livre-comércio levado por alguns média à condescendência criminosa”, ou que estamos finalmente a receber os dividendos de uma estupidez extrema, “seres arrogantes, descerebrados por demasiadas dependências”.
Enquanto na Terra o cenário é de pânico total, na órbitra terrestre as coisas não estão melhores. Uma expedição resulta numa catástrofe onde há apenas um sobrevivente, de seu nome Kameron Odd, um de dois pilotos da expedição. A questão que se coloca é esta: estará o bug terrestre relacionado com o regresso de uma nave proveniente de Marte? E que bug transportará Kameron no pescoço, que o faz carregar uma mancha azul no sobrolho que alastrardia após dia?
Sucedem-se os assaltos ao armamento, o suicídio aumenta entre os adolescentes, os incêndios, raptos e pilhagens tornam-se primeiras capas dos jornais. Por falar em jornais, o leitor acompanha também as primeiras páginas do Le Monde Today, “o diário dos últimos geeks que se está a lichar para quem lhe sensura os erros de ortografia”.
Para além de Kameron, a história tem como grande protagonista Emma, a sua filha, que tem à perna um psicopata e se pode tornar o engodo perfeito para meio mundo chegar a Kameron, que de súbito se transformou no segredo bem menos guardado do planeta. E temos também Junia Perth, que alia coragem ao fabrico de mantras românticos como este: “A clandestinidade a dois é muito mais agradável”.
O ritmo é alucinante, tendo Bilal atirado praticamente com todo o texto descritivo às urtigas, usado os balões de narração com parcimónia e apostado muitas das fichas numa narrativa visual feita com muita arte e diálogos geométricos. O segundo volume está também disponível nas livrarias portuguesas com o selo da Arte de Autor.
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