“Dez anos depois a história continua… Passou-se uma década desde o desaparecimento das máquinas, e, na sua ausência, a magia reclamou o seu lugar no Universo! Agora, uma rapariga partirá numa demanda épica em busca dos robôs e de Tim-21, o messias deles, antes que seja demasiado tarde…”
Foi esta a promessa deixada em “A Guerra das Máquinas”, o sexto e último volume da série Descender, que valeu à dupla Jeff Lemire e Dustin Nguyen um grande número de prémios e nomeações. Série que, partindo do imaginário sonhado em Blade Runner, acabou por ganhar vida própria, transformando-se numa space opera com muito metal à mistura. Uma promessa que começa agora a ser cumprida em “A Galáxia Assombrada” (G. Floy, 2021), o primeiro volume da nova série que se situa uma década depois de Descender – e que foi baptizada de Ascender.
No lançamento de Ascender, temos direito a uma visita guiada a várias geografias, muitas delas já familiares, para uma actualização do estado das coisas: Knossos, em tempos o mais pequeno planeta do Conselho Galáctico Unido, é agora uma terra de escravos, onde a liderança pertence à Mãe, “a luz na escuridão”, “o grande feiticeiro. A esperança”. Uma bruxa que é como uma espécie de Big Brother lá do sítio, mas sem medo de mostrar a cara; Sampson, em tempos o maior planeta do Conselho Galáctico Unido, lar do seu centro militar e das suas maiores cidades. Agora, um mundo devastado que recuou à era pré-tecnológica e se viu isolado do resto da galáxia, seguindo as pisadas da figura construída por Orwell: “A mãe é grande. A mãe adora-vos. A mãe vê tudo”. É aqui que vivem Andy e Mila, que ao recusarem o “salvamento” são obrigados a viver como eremitas. Sempre que Mila cai na tentação de abraçar a doutrina da Mãe, Andy recorda-lhe a verdade que os tem guiado e que tem origem na sua mãe verdadeira: “deu a vida para que pudesses ser livre”; Mata, um mundo aquático desprovido de vida senciente, lar de uma antiga colónia robótica. Agora, lar da fortaleza da Mãe e santuário do seu conventículo. Lugar onde foi deixada, por um mago desconhecido, uma cabeça de um robô, bem como um estranho aviso com ar de oráculo: “Atenta ao cão com a língua revirada”; ou, ainda, o Planeta Gnish, lar da única monarquia da Galáxia, em tempos lar dos sucateiros e terra dos robôs.
Mila, a jovem a quem cabe o protagonismo maior em Ascender, expressa um lamento duplo em forma de perguntas: “Porque não nasci antes de os Colectores destruírem tudo, antes de a Mãe ter nascido? Como teria sido viver no meio de robôs?”. Perguntas que, após diversos flashbacks e a entrada em cena de alguns personagens que deixaram saudades, perderão parte do seu lado retórico, abrindo lugar a uma nova aventura onde cabe ao leitor sentar-se na cadeira de co-piloto. Jeff Lemire e Dustin Nguyen dão aqui uma nova vida a uma série que já era incrível. Ascendamos sem medo.
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