Dores, gritos, visões, medo, dúvida e obsessão. O tom marcado no prólogo de “As Raparigas Perdidas” (Topseller, 2018), assinado por Simone St. James, vai satisfazer qualquer leitor que goste de thrillers.
Há quem o tenha definido como um romance gótico, dada a ambiência de um dos cenários em que a narrativa se desenrola: nos anos ’50, quatro amigas frequentam um colégio interno caracterizado por sombras, portas que rangem, silêncio, histórias de fantasmas, mensagens escondidas em livros antigos. Uma aura indesvendável rodeia Idlewood Hall e afecta todos que lá estão, o que é identificável pelo comportamento (inconsciente) de defesa e auto-preservação. A presença constante de medo é tão marcada que se anula a si própria, como se se tivesse tornado forma de vida e todas as professoras e alunas já só conhecessem esta realidade.
Uma tragédia abate-se nesta escola, e cedo descobrimos não ser a única. Quantas mortes são necessárias para assombrar ainda mais um local sombrio só por si, bem como quem por lá passa? A resposta é dada mais de sessenta anos depois, quando uma jornalista decide fazer uma peça sobre este local abandonado há décadas e que, por motivos que quer esclarecer, foi agora comprado para total remodelação. Mas este não é um livro sobre investigação jornalística. É sobre a perda e a tentativa persistente e a determinação inabalável de uma mulher em compreender a tragédia da sua própria família, que culminou precisamente em Idlewood Hall vinte anos antes.
A exigência de uma resposta e do luto. A necessidade de uma explicação. A urgência de paz. Tudo isto é catalisador para Fiona e comum ao ser humano: a premência de controlo. E é esta resolução que a leva a deparar-se com o passado e a entender que a história da sua família é a história do colégio, na medida em que o desespero, o medo e a desgraça traçaram os seus percursos. E, quando acontece este ponto de intercepção, acompanhamos o desenvolvimento de personagens em dois eixos cronológicos diferentes: meados do século XX e início do século XXI.
Até que ponto a determinação enraizada é saudável? Quanto pode estar disposta uma pessoa a sacrificar para encontrar paz e justiça (moral)? Quando é que a liberdade de um termina, se se cruza com os limites do próximo? Quais os argumentos que pode apresentar para continuar a viver uma saga que, a certo ponto, garante que a sua realidade se mantém segura e confortável? Até onde a amizade e o sentimento de família são o incentivo para a definição de uma forma de vida? Estas são algumas das grandes questões do livro para serem apreciadas, além de algumas surpresas e passagens muito intrigantes.
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