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Arquipélago de Escritores: Rir é mesmo o melhor remédio

Por Pedro Miguel Silva · Em 16/11/2019

Um lisboeta, um micaelense e um terceirense entram num auditório de uma escola e… partem a louça toda (isto se alguém tivesse cometido a loucura de deixar um prato ou um copo por perto). Foi mais ou menos isto que aconteceu na Escola Domingos Rebelo, em S. Miguel, com um trio composto por Filipe Homem Fonseca, Francisco Câmara Bradford (aka Balada Brassado) e Luís Filipe Borges, que à boleia do Arquipélago de Escritores foram testar o humor das novas gerações, numa conversa que teve como tema “Escrever a Rir” e contou com uma plateia entusiasta.

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À pergunta de Rita Fazenda sobre se o acto de escrita humorística era, ele próprio, um acto humorístico in the making, entrámos no mundo da roupa interior e do desmazelamento. Para Filipe Homem Fonseca, trata-se sobretudo de “um acto profissional. Se as coisas correrem bem, então rir-nos-emos do que escrevemos. Às vezes escrevo muito mal humorado. Quando estou bem disposto normalmente não me apetece escrever. O acto de escrever não tem assim muita piada: escrever de cuecas, com ar deprimente e deprimido, aproveitando a depressão e a auto depreciação de se olhar ao espelho para alimentar o acto criativo. Rindo também de mim próprio“.

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Luís Filipe Borges está no mesmo barco de Filipe, fazendo da auto depreciação uma força: “Adorava escrever a rir, mas faço parte do grupo de pessoas que escreve em cuecas, desgrenhadas, com a agravante de gostar de trabalhar em cafés. Gosto de ir ao café para evitar demasiados confrontos com o espelho. E também, desculpem o cliché, fazendo de vampiro das histórias alheias. Que se perderiam para todo o sempre se não fossem transformadas em episódios de escrita. Há que captar as pérolas da realidade“.

Francisco Câmara Bradford é, também ele, um rapaz muito dado à criatividade praticada em trajes menores: “É tudo igual ao que eles falaram, mas eu uso boxers em vez de cuecas. Escrevo também normalmente mal disposto. Para arranjar temas relacionados com os Açores tenho de estar nos sítios. Ouço e dou uma volta. Não me rio com o que escrevo, mas tento rir-me depois disso. Sou muito auto-crítico“.

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E será o humor uma arma, algo capaz de seguir uma agenda ou de escolher os temas a dedo para servir de veículo a mensagens? Luís Borges, que já se habituou a que a comédia seja olhada como um género menor, desconfia dos humoristas trendy, que fazem da mensagem o veículo fundamental.  “No Cinco para a Meia Noite queria ter orgulho nos conteúdos e não ter de fazer fellacios aos convidados. Até surgir a humanização dos políticos, que começaram a ver isto como uma forma de saírem humanizados. Tal como aconteceu um pouco com Trump quando foi entrevistado por Jimmy Fallon“.

Uma humanização que surgiu também numa fase mais avançada do Contra-Informação, do qual Filipe foi guionista, onde a certa altura todo o político queria ter o seu próprio boneco. “Deixaram de me convidar para as festas porque gostava de fazer piadas com os políticos que lá estavam. A comédia tem a função de dessacralizar as coisas, de retirar o peso e a seca das questões. E por vezes a única forma de abordar questões sérias é através da comédia. É o contexto que serve de bitola ao humor. O humor não tem de passar mensagens porque, assumindo essa responsabilidade, põe-se a jeito. Não há obrigatoriedade moral e ética no humor“.

Francisco, que teve de recorrer à criação de um alter ego para se desligar do pedigree a que estava associado numa terra pequena, não considera a comédia um território neutro. “O meu objectivo principal é o de passar mensagens, nisso discordo um pouco do Filipe. Uso o humor como activismo. Ao criar o Balada Brassado tive uma liberdade maior de dizer o que queria, quebraram-se muitas barreiras“.

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E poderá o humorista dar-se ao luxo de escolher aquilo a que quer deitar mão? Luís acha difícil esse milagre. “Eu acho que a malta não escolhe, a malta é escolhida. Comecei a escrever porque, por acaso, fui para as Produções Fictícias. Temos de servir o meio da melhor forma possível. Não posso estar preocupado com as repercussões disso, numa era de um certo fascismo e do politicamente correcto. Daqui a duas gerações vai voltar o punk, e esta vai ser vista como uma geração ninhas (omito aqui a primeira sílaba). Odeio o humor negro português com o Sinel de Cordes à cabeça. Mas não quero que isso acabe, não pode funcionar dessa forma“.

Quanto a referências, Francisco chega-se à frente com John Cleese e os Monty Python, Luís refere os sketches do Herman José e Filipe prefere exaltar Rick & Morty, “a melhor série de todos os tempos“. Questionados sobre em que é que o humor açoriano difere do continental, Luís Borges arruma com o tema à primeira bolada: “Isso era como perguntar se o sexo também é diferente. Talvez seja mais vulcânico. Uma personagem como o Balada tem o seu target, mas pode ser compreendida em todo o país” – “Mas só se tiver legendas“, complementa Francisco. Antes do final apoteótico, com Balada Brassado a interpretar um dos seus raps já clássicos, Luís Filipe Borges deixa um conselho pertinente às novas gerações: “Citando uma personagem de um filme, evitem as drogas. As drogas são caras. Trabalhem, sejam conhecidos, e depois alguém vos vai oferecer tudo isso de graça“.

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Pedro Miguel Silva

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