Se há vozes que fazem parte do imaginário de quem tem por bom hábito ouvir a rádio que também é Radar, a de Inês Maria Meneses será, sem qualquer dúvida ou sombra, uma das mais cativantes. Uma mistura de sensualidade e desprendimento, de criancice e conversa séria, algures entre o riso e o sussurro que parece emanar um poder encantatório sobre aqueles que a vão escutando, tal como aquelas sereias marotas que nadavam na Odisseia de Ulisses.
Para além da boa música e perfumada conversa, aqueles que a ouvem podem sempre contar com o disparar de trocadilhos, que tanto podem incluir o nome de uma banda como, também, marcas publicitárias, apontamentos religiosos ou qualquer outra coisa que sirva para transformar o quotidiano em piada com direito a banda sonora.
Da rádio para o papel – e também para sacos de pano -, os trocadilhos de Inês Meneses chegaram às livrarias com o título “Amores (Im)Possíveis” (Abysmo, 2018).Para além do clássico “Ele ouvia Fleetwood no Mac dela“, há danças gramaticais, quase sempre no binómio ele/ela, com diferenças tecnológicas – “Ele era do tempo do bolo-rei e ela do blu-ray” -, referências políticas – “Ele chamava-se Nelson e pediu a Mãodela” -, apontamentos musicais – “Ele chamava-se Adolfo Luxúria Canibal, e ela era um bom garfo” -, versículos religiosos – “Ele era sacristão e ela sofria de hóstia porose” -, pensamentos filosóficos – “Ela estudava filosofia e ele viu-a na Kantina” -, conhecimentos enólogos – “Quando lhe disse que era enólogo, ela ficou com Borgonha” -, uma deliciosa propensão para a gastronomia – “Era um pãozinho sem sal mas ela tinha um coração de manteiga” – ou, ainda um piscar de olho a questões de género – “Era homofóbico e desamigay“.
As ilustrações de Tiago Galo, que casam duas cores que em campo faíscam – o azul e o vermelho -, brincam aos tipógrafos no que toca ao lettering, remetendo, nos desenhos, para um imaginário que poderia servir de base a uma campanha temática sobre o 25 de Abril. A antecipação do segundo volume poderá ser acompanhada, de segunda a sexta e em directo, nas radiosas manhãs na Radar.
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