“– Não vens muito a leilões, pois não? A Maldição do Vencedor é quando uma licitação fica no topo, mas só porque se pagou um preço muito elevado.”
Entre 1591 e 1595, William Shakespeare escreveu a maior de todas as tragédias que a literatura colocou em palavras e que, ao longo dos séculos, tem servido para subir a palcos, ser adaptada a séries de televisão ou acabar recriada de acordo com o espírito dos tempos, como o fez corajosa e de forma cinéfila Baz Luhrmann: Romeu e Julieta, história de dois adolescentes e de um amor – ou pelo menos de uma grande paixoneta – que está condenado a acabar mal.
Marie Rutkoski frequentou a Universidade do Iowa, viveu em Moscovo e Praga e estudou Shakespeare na Universidade de Harvard. “A Maldição do Vencedor” (Topseller, 2016), livro que se vem juntar à sua lista de bestsellers, tem marcadamente uma costela Shakespeariana. A batalha original, onde Shakespeare colocou de lados opostos da barricada Capuletos e Montecchios, é agora disputada entre Valorianos e Herranis, num mundo onde a escravatura é moeda corrente e a divisão de classes impera de acordo com etnias e nascimento.
Kestrel é a jovem filha de um poderoso general de Valoria, o que apenas lhe confere duas opções de vida: alistar-se no exército ou casar-se. Num passeio clandestino pelo lado menos aconselhável da cidade, depara-se com um jovem a ser leiloado. Arin, pertencente aos Herrani – um povo sonhador, facilmente conquistado dez anos antes pelos Valorianos -, tem desenhado no rosto o desafio e a rebeldia e, num impulso, Kestrel decide comprá-lo por um preço tão elevado que leva a cidade a tecer uma teia de mexericos.
Além de ser um ferreiro exímio diz-se dele ser um cantor extraordinário, o que desperta a curiosidade de Kestrel uma vez que também ela toca piano e a música, essa, é uma coisa proibida nos tempos que correm. Há, contudo, um outro segredo escondido por Arin, que mudará não só a vida de ambos como a de todo o reino.
Nas mãos de Rutkoski, uma história banal e mil vezes escrevinhada ganha um ritmo alucinante, graças a uma cuidada descrição das personagens, uma construção meticulosa de ambientes e cenários e uma trama que tanto tem de avanço amoroso como de livro de espionagem. Não faltam as intrigas, os segredos, os jogos de poder e as facadas nas costas, ingredientes obrigatórios num mundo onde a luta pelo trono é uma constante. Uma boa surpresa.
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