Em 2006, o iraniano Jafar Panahi realizou “Offside”, uma comédia com uma considerável carga dramática, onde tocava no tema da proibição das mulheres iranianas em assistirem a jogos de futebol nos estádios do seu país. “A Época das Rosas” (Planeta Tangerina, 2020), assinado por Chloé Wary, não tem lugar no Irão ou na luta por um lugar na bancada, mas aborda igualmente, através do desporto rei, a diferença de tratamento dada a homens e mulheres que, muitas vezes, deixa a justiça de lado para apostar no sempre mais fácil lugar-comum – ou em estereótipos e preconceitos que vão sendo passados de geração em geração.
Nesta história em formato de novela gráfica acompanhamos as Rosas de Rosigny, uma equipa de futebol de um bairro dos subúrbios, decidida a qualificar-se para o campeonato nacional feminino. Porém, um corte nos subsídios obriga a directora a reduzir custos, decidindo retirá-las da competição para apostar tudo na equipa masculina, mesmo que esta fique a milhas da equipa feminina tanto em questões de aplicação como de qualidade.
Barbara, a capitã de equipa destas Rosas, é uma adolescente efervescente, que prefere chuteiras a sabrinas, e fará tudo ao seu alcance para contrariar esta decisão. Nem que para isso tenha de arranjar um patrocinador de ponta, ou vencer a equipa masculina num improvável onze contra onze.
Chloé Wary capta com olho de lince, para além das diferenças e injustiças entre sexos, o tumulto da adolescência – o quarto de Barbara é um autêntico prato -, a fúria hormonal, a descoberta e explosão do corpo, bem como a relação fria e tempestuosa de Barbara com a mãe, a quem aponta o dedo por ter já aceite as regras do sistema – e que considera incapaz de lutar por sonhos, direitos ou tudo o que não fuja às impostas normas sociais.
As ilustrações são de encher o olho, com cores vibrantes que preenchem cada um dos quadradinhos, destacando-se a forma como vemos uma cidade inteira respirar e mover-se, envolta num céu inconstante que vai alternando os seus estados de espírito – e, com isso, os de quem por baixo dele vai vivendo.
Recomendado para maiores de quinze anos, “A Época das Rosas” levou para casa o prémio do público na edição deste ano do Festival Internacional Angoulême de Banda Desenhada. Faz parte da colecção Dois Passos e Um Salto, feita à mão para adolescentes e outros leitores mais crescidos.
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