Depois do sucesso conquistado com “As Gémeas de Gelo”, o jornalista e escritor britânico S. K. Tremayne volta a carga com mais um interessante, poderoso e arrepiante exercício narrativo.
Chama-se “A Criança de Fogo” (Topseller, 2016) e tem como cenário o sublime e inspirador vale de Carnhallow, na Cornualha. No âmago da narrativa está Rachel, uma mulher que se sente na plenitude da sua vida principalmente devido ao seu amor incondicional por David, o homem da sua vida.
Movida por um impulso desconhecido, Rachel abandona o buliço londrino e muda-se para a Cornualha, tendo como meta ser feliz e transferir esse sentimento para Davis, o seu marido, e Jamie, filho deste e seu adorável enteado que atravessa um complexo período de dor provocado pela estranha morte da sua mãe.
Mas, de repente, tudo muda. Jamie começa a agir de forma estranha, anunciando mórbidas revelações, afirmando que a sua mãe ainda vive naquela casa: um espaço intrigante, com sinistras vibrações, assombrado por uma história que Rachel começa a achar muito mal contada e cujos contornos são assustadoramente arrepiantes. Quais as fronteiras entre a verdade e a mentira? Até que ponto as revelações e avisos de Jamie sobre a morte de Rachel no dia de Natal são reais?
Composto por capítulos curtos e dinâmicos, “A Criança de Fogo” torna o acto da leitura numa espécie de luta contra o tempo, sendo um dos seus maiores trunfos o espaço da acção: uma Cornualha sempre selvagem, intrigante e escura que tem tanto de atraente como de perigosa. Esse ambiente ganha ainda mais intensidade pelo sublinhado das fotografias de cariz gótico (da responsabilidade do fotógrafo John Charles Burrow e que se referem a imagens da década de 1890, numa época em que as minas locais estavam no seu auge), que “ilustram” alguns dos capítulos conferem.
No seio do turbilhão, Tremayne dá a Rachel o papel charneira, uma mulher que navega num apocalíptico labirinto que se tornou a sua nova vida, sentindo-se esmagada pela dúvida e medo. Também o personagem de Jamie está muitíssimo bem construído. O seu perfil navega entre a doçura e uma assustadora frieza, nunca deixando de ser estranhamente empático e simpático. Esses atributos atrativos nascem principalmente da habilidade do autor britânico em trabalhar de forma competente os aspectos sobrenaturais que derivam dos traumas de uma criança que perdeu a sua mãe.
Aconselhado, principalmente, a fãs de thrillers, “A Criança de Fogo” revela-se numa experiência imersiva, que se apoia em excelentes descrições e numa prosa que deambula entre o lirismo e laivos atmosféricos, características sempre devidamente alicerçadas numa percepção periclitantemente psicológica.
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