“A Autobiografia de Alice B. Toklas” (Ponto de Fuga, 2017), escrita por Gertrude Stein em 1933, resulta de uma provocação lançada pela própria escritora à secretária particular e parceira de longa data, mas agarrada pela própria Stein. Sabia que, através da mesma, escrevendo-a “com a mesma simplicidade com que Defoe escreveu a autobiografia de Robinson Crusoe”, retrataria a sua própria existência.
Escritora, poetisa e activista feminista, Gertrude Stein (1874-1946), norte americana, passou grande parte da sua vida rodeada por ilustres intelectuais e artistas como Picasso, Matisse, Hemingway e James Joyce, entre muitos outros, chegando mesmo a ser responsável pela ascensão de alguns deles através da promoção que fez dos seus trabalhos em encontros e tertúlias que marcaram toda a sua existência, por onde quer que passasse, em especial em Paris, onde viveu grande parte da sua vida. Pablo Picasso, com o qual manteve uma ligação duradoura, chegou mesmo a imortalizá-la num célebre retrato.
“A Autobiografia de Alice B. Toklas”, embora escrita por Stein, é narrada do ponto de vista de Alice, espelhando a vida de ambas ao longo de vinte e cinco anos: os círculos artísticos em que se movimentaram, a relação com os grandes criadores, pormenores domésticos, picardias e desavenças, cumplicidades e amizades. Mundividências. “As esposas dos génios com quem me sentei. Sentei-me com tantas. Sentei-me com esposas que não eram esposas, de génios que eram verdadeiros génios. Sentei-me com esposas verdadeiras de génios que não eram verdadeiros génios. Sentei-me com esposas de génios, de quase génios, de aspirantes a génio, em suma sentei-me muitas vezes e durante muito tempo com muitas esposas e esposas de muitos génios”.
A obra está organizada em sete capítulos, entre a chegada e a permanência em Paris, a vida durante o primeiro conflito mundial e a reorganização no pós-guerra, retratando com detalhe o período de 1907 a 1932.
Quando foi publicada, em 1933, tornou-se de imediato um sucesso pela revelação e detalhe dos pormenores relatados relativamente à convivência social de então, um verdadeiro repositório de historietas e boatos. Nesta como noutras obras, Stein apresenta uma narrativa considerada por muitos como desprovida de recursos literários, automática, para outros inspiradora de uma prosa experimental, temperamental, ao ritmo da experiência retratada.
Uma obra com 84 anos, considerada das mais célebres e lidas de Gertrude Stein, uma referência entre as obras de não ficção em língua inglesa. Traduzida e anotada por Nuno Quintas, a versão portuguesa inclui diversas fotografias da autora, desde a infância à idade adulta, na companhia de familiares e junto de Alice B. Toklas.
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