Há uns anos atrás, graças a uma espécie de lifting protagonizado pela saga Crepúsculo e outras derivações literárias, os vampiros passaram a ser vistos como bons rapazes, esmagados pela melancolia e brilhando no escuro como lâmpadas fosforescentes.
“Vampiros” (Avec Editora, 2014), colectânea de contos de autores brasileiros – que integra a Coleção Sobrenatural da editora brasileira AVEC Editora -, recupera os bons velhos tempos em que os vampiros eram olhados – e temidos – como predadores nocturnos, sedutores e monstruosos, procurando satisfazer uma sede eterna para a qual não existe cura.
As propostas de “Vampiros” são variadas: em “O dia de caça” seguimos os passos de Diego, um promissor estudante de direito, atirado para um mundo subterrâneo secreto dominado pelos vampiros dez minutos antes de assistir ao Nosferatu de Murnau; “O vampiro cristão” oferece um teste à verdadeira fé, comprovando que por vezes é melhor perder uma alma para salvar muitas outras; “Anunciação” é o curto relato de uma epifania; “A fonte da donzela” mostra que a espera, contra todas as previsões, acaba mesmo por compensar; “Colonização” apresenta-nos aos sanguíneos, recriando a máxima literária – e prática – de que os fins justificam os meios; em “Parsifal”, Shakespeare encontra os cavaleiros da Távola Redonda nas margens de um lago de sangue.
O destaque maior vai para quatro dos contos da colectânea: “Sangue e poeira” tem o cheiro de um western, uma história de mitos e poeira que, através do cultivo desregrado da soja, nos traz à memória o recente Interstellar; “O orquidófilo” conduz-nos, através de fragmentos de um diário de viagem, à cruzada de um homem por uma orquídea rara, «que só cresce em árvores secas, no oco morto, ao abrigo da luz»; “Olho por olho” é uma história de vampiros em formato policial, em que Cecily, formada em psicologia, sociologia e medicina legal, é incumbida da tarefa de dar caça a um vampiro que procura uma fêmea para com ela dividir a imortalidade – deixando um rasto de corpos até alcançar o seu propósito; All in” tem como protagonista Paulo, um tipo bastante rico que não gosta da rotina e que classifica as pessoas de acordo com a tipologia das fontes de letra. O destino faz-lhe a vontade: marca-lhe um jogo de póquer com um grupo de vampiros onde está em jogo a sua vida. Para além de sangue e muito dinheiro.
Apostando na diversidade de estilos e temas, “Vampiros” reacende no leitor a admiração por um ser que, tanto na história oral como na da literatura, tem sido objecto de muita paixão e, sobretudo, temor. Fica o aviso: protejam bem esses pescoços.
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