A II Guerra Mundial acabou há pouco e, na enfermaria X, apenas restam cinco pacientes e a sua dedicada enfermeira Honour Langtry. Contrariamente à expectativa, chega mais um paciente àquela unidade, de seu nome Michael Wilson. É assim que nos é introduzida a narrativa de “Uma Obsessão Indecente” (Bertrand Editora, 2015), da autora australiana Colleen McCullough, falecida no início deste ano.
A X não é uma enfermaria normal. É uma ala psiquiátrica, destinada a combatentes dos trópicos com doenças mentais provocadas pela guerra. Cinco homens, muito diferentes entre si, quer em termos de temperamento, quer em termos de problemas, toleram-se e convivem, sem grandes percalços. Todos sentem verdadeira devoção possessiva pela enfermeira. E ela vive para eles, ama-os maternalmente.
Quando Michael, um sargento sem qualquer problema psicológico, passa a ser o sexto ocupante da enfermaria – a poucas semanas desta fechar e da eminência de todos regressarem a casa -, a rotina e o frágil equilíbrio do pequeno grupo sofrem um abalo. Uma vez que não se trata efectivamente de um doente, imediatamente todos notam o interesse que Langtry começa a nutrir pelo recém chegado, que tem a vantagem de não ser emocionalmente diminuído como os outros. Contudo, as aparências enganam e o seguro Michael é, afinal, uma pessoa atormentada pelo passado, embora evite demonstrá-lo.
A convivência forçada e difícil entre todos acaba por se tornar pacífica, mas o facto de Honour parecer preferir a companhia de Michael e de começar a alterar o seu comportamento gera alguns ciúmes – a verdade é que o ambiente na enfermaria se transforma numa bomba pestes a explodir. A enfermeira era como um rochedo inabalável a que os seus pacientes se agarravam, cada um à sua maneira, e significava a calma, a paz e o socorro após tudo o que sofreram na frente de guerra. O resultado de uma carga tão pesada só pode ser trágico. De que modo, terá que ser o leitor a descobrir.
“Uma Obsessão indecente” é um livro sem muita acção mas com uma enorme bagagem psicológica, baseada no amor obsessivo e em alguma informação histórica sobre o ambiente dos pós-guerra, bem como na expectativa de se poder retomar a vida que se tinha antes da guerra. É uma narrativa triste, que analisa as marcas da II Guerra Mundial não só nos corpos como, também, nas almas, quer de homens quer de mulheres. No final do conflito muitos pensaram que poderiam voltar à rotina que tinham anteriormente, exactamente no ponto em que a tinham deixado antes de deixarem os seus e de partirem, mas a conclusão amarga a que os sobreviventes chegaram foi a de que isso jamais seria possível. Mais do que uma leitura leve, trata-se aqui de absorver e reflectir sobre os desígnios da mente humana.
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