«Tive a sorte de aprender a falar mais ou menos.» A frase pertence a Josef Schovanec, nascido em Paris no ano de 1981, autista de corpo inteiro. Aos 19 anos, depois de experimentar vários medicamentos, foi-lhe feito o diagnóstico que o impediu de ser internado e lhe permitiu aprender a viver com a síndrome de Asperger, muito também graças a um pai e uma mãe que nunca desistiram de si.
“Sou autista” (Oficina do Livro, 2014), escrito pelo próprio Schovanec, é a história de uma luta pessoal e familiar contra a (in)diferença, num mundo pouco dado a aceitar algo que fuja à norma, seja ela difundida numa sala de aula, numa conversa de circunstância ou num corredor do supermercado.
Em pouco menos de 300 páginas Schovanec oferece-nos o seu testemunho de vida, desde tenra idade até aos dias de hoje, em que dá conferências no mundo inteiro e trabalha como investigador na universidade de Bucareste. Isto depois de, há uns anos, se ter doutorado em filosofia pela prestigiada Sciences Po Paris, continuando actualmente os estudos em línguas, matéria que o apaixonou desde sempre.
Desenganem-se os que acham que vão encontrar um livro pleno de sentimento e a convidar à companhia de um maço de lenços de papel para enxugar as lágrimas. Josef conta a sua história com muito humor, sensibilidade e espírito crítico, relatando todos os obstáculos e ensinamentos que foi encontrando ao longo da vida: a dificuldade que teve em aprender a andar – fê-lo tardiamente e de forma desajeitada, algo que se mantém hoje em dia -, a violência a que foi sujeito na escola e que começou logo na pré-primária, a difícil relação com os professores – a quem costumava corrigir -, a Ciel et Space como a revista que o ajudou a criar uma personalidade e a aprender de alguma forma a socialização, os esconderijos que se habitou a descobrir e a usar regularmente, a licenciatura sem sabor, o mantra que encontrou para a vida em forma de triângulo – regularidade, rotina, previsibilidade -, os neurolépticos e os ansiolíticos que veio a tomar como smarties.
Mais do que uma biografia ou um livro sentimental, “Sou autista” é uma grande lição de humanidade, de alguém que abriu as portas do seu mundo interior para nos mostrar que a diferença é essencial para a vida, assim como a sua compreensão e aceitação.
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