Para aqueles aos quais a ideia da finitude bate à porta da consciência de tempos a tempos, muito provavelmente a questão seguinte será algo recorrente: o que deixaremos para trás quando a viagem chegar ao fim, qual será a nossa marca no mundo? Sue Townsend, escritora falecida em Abril deste ano, deixou-nos a sua impressão digital; uma marca tão carregada que, daqui a mil anos, muito provavelmente ainda se ouvirá falar no seu nome. A razão para essa fama intemporal tem duas palavras: Adrian Mole – o diarista mais amado da Grã-Bretanha e, arrisque-se dizer, de todo o planeta.
Em “Os anos complicados de Adrian Mole” (Editorial Presença, 2014), o quarto livro da saga que segue à risca uma ordem cronológica, Adrian continua a ter uma existência muito complicada. Apesar de estar a viver com Pandora, o amor da sua vida, não se livra do fato de ter de partilhar a casa com o marido desta mas, também, com o amante. Um estranho triângulo que, infelizmente para Adrian, não parece propenso a transformar-se num quadrado.
E, como se a desgraça amorosa não fosse suficiente para lhe pintar a vida num preto e branco deslavado, Adrian perde o seu razoável emprego no Ministério do Ambiente em Oxford, tudo por causa de uma colónia de tritões, tendo de ganhar a vida a lavar pratos para os lados do Soho em regime de part-time.
De qualquer forma, Adrian Mole é rapaz para não se deixar abater, continuando a dedicar grande parte do seu tempo à escrita de Olhai! As Colinas Planas da Minha Pátria, mesmo que as poucas críticas recebidas estejam longe de ser animadoras. E é quando tudo parece estar a caminho da derrocada que a vida de Mole vai entrar em modo de montanha-russa, trazendo algum sol à penumbra onde parece estar mergulhada a sua vida.
Há, porém, coisas que nunca mudam, para deleite do leitor assíduo do universo de Mole: o rapaz continua a requisitar livros na Biblioteca Pública, a tomar conta do indomável Bert Baxter, a olhar pela mãe que bebe demais e está casada com um marido 23 anos mais novo. E que, de modo a manter a sua sanidade mental a um nível perto do razoável, começa a frequentar o consultório de uma psicóloga, onde larga 30 libras semanais apenas para olhar para umas curvas que ficariam bem desenhadas numa pista de F1.
Mesmo sem contar o efeito surpresa dos primeiros volumes, pelo menos para quem acompanhou a saga desde o momento em que Mole contava apenas com 13 primaveras e 3/4, “Os anos complicados de Adrian Mole” representa mais um capítulo imperdível da vida de um rapaz inglês que nasceu no meio de uma família disfuncional, que é um zero no que diz respeito à vida amorosa e que tenta, a todo o custo – e sem qualquer empurrão de coragem -, cumprir o sonho de se tornar num grande romancista ou poeta. Um verdadeiro clássico, Mole é já parte importante da História da Literatura que possua sentido de humor.
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