Para os amantes e assíduos leitores do chamado género policial, a leitura de “Linda – Como no Homicídio Linda” (Bertrand Editora, 2015) é, desde o princípio, um desafio posto à atenção, um caminhar por uma estrada em que se está sempre a ser conduzido por atalhos que ameaçam travar a marcha. Atalhos, esses, formados das palavras e pensamentos do Superintendente Evert Backstrom, principal interveniente e guia da acção.
Backstrom pode ser descrito como uma criatura primitiva, a encarnação do politicamente incorrecto, ao que se poderá acrescentar um relacionamento com a espécie humana como uma tarefa que tem sempre associada uma grande e descomunal maçada. As pessoas parecem constituir uma amálgama desprezível: as mulheres são classificadas em função dos seus peitorais e glúteos, para além das chatices que causam; os homens não são tratados com maior apreço e as pérolas fluem no seu pensamento; os colegas são eleitos pela sua capacidade de atacar grades de cerveja e outros atributos do mini-bar, para além da sua utilidade aproveitável. Ou seja, temos um convívio demorado com um ser preguiçoso, egocêntrico, alcoólico, racista, misógino e xenófobo, entre outros predicados, numa investigação demorada sobre o homicídio de uma jovem agente estagiária da polícia.
O autor, Leif Persson, criminologista e reconhecido profiler da Suécia, dá-nos o acesso ao interior de uma investigação policial de forma exaustiva, onde mostra as hierarquias do sistema, os níveis de decisão, os bastidores do que se torna público, o papel dos média e, até, dos movimentos cívicos. A interromper a sequência dos acontecimentos temos apontamentos sobre o passado e o presente de alguns dos intervenientes, em que há direito a divagações sobre o cultivo de morangos gigantes, bicicletas de crianças e listas de lavandaria. Mas tudo gira e volta a Backstrom – e às suas cervejas -, que nos brinda com um isolado vislumbre de ressonância emocional quando recebe a notícia da morte de Egon, o seu peixe de estimação e, simultaneamente, o único ser vivo de que cuida e quer cuidar.
Há quem diga que este é um livro de difícil degustação, que é necessário ter um paladar educado ou aberto para conseguir apreciar tudo o que está para além dos sabores óbvios. Porém, por muitas teorias sobre o gosto, a estética ou a apreensão daquilo que está para além do evidente, dificilmente se repetirá a leitura para perceber o que escapou durante a primeira prova.
“Linda”, o primeiro livro de uma trilogia, deu origem à série “Backstrom”, que estreou na FOX americana em Janeiro deste ano.
Sem Comentários