E eis que, ao terceiro volume da colecção, a História do Corpo entra de rompante pela Revolução Francesa, numa altura em que o corpo ocupa um espaço no qual passeia todos os seus invólucros: “a pele, o halo sonoro da voz, a aura da sua transpiração.” Um corpo manipulado, dissecado, sentido, tocado, contemplado, objecto da ciência e sujeito às agruras do tempo.
Neste primeiro tomo – de dois – intitulado “Da Revolução Francesa à Grande Guerra” (Círculo de Leitores, 2015), o corpo é o centro do prazer mas também da dor, ocupando o lugar das sensações enquanto epicentro do sensualismo. Neste volume e no próximo, procura-se demonstrar como este período da História procurou encontrar um equilíbrio entre o corpo enquanto objecto da ciência, por um lado, e o corpo imaginado, por outro. Um equilíbrio que abriu também as portas – bem como as janelas – ao florescimento da psicanálise, que terá uma importância que se estenderá muito para além destes dois volumes.
Naquele que é provavelmente o mais entusiasmante volume desta recomendada colecção até à data, fala-se de temas múltiplos e variados: “…influência da medicina anatómico-clínica e da frenologia, o advento da anestesia, a emergência da sexologia, o florescimento da ginástica e do desporto, o aparecimento de novos tipos de fábrica impostos pela Revolução Industrial, a construção de uma taxonomia social do corpo, a ruptura radical da representação do eu.”
O livro, acompanhado como sempre por ilustrações, gravuras, reproduções de quadros ou fotografias, apresenta-se dividido em duas partes: “Olhares cruzados sobre o corpo” e “Prazer e dor: no coração da cultura somática.”
Na primeira parte fala-se do saber dos médicos acerca do corpo, da sua anatomia e fisiologia, do modo em como os cristãos fervorosos e os clérigos olhavam para o corpo e, também, do olhar dos artistas sobre o corpo, incluindo as obsessões e os fantasmas que orientavam esse mesmo olhar.
Na segunda parte entramos numa das mais interessantes abordagens à História do Corpo, onde se examina o prazer e a dor como o seu ponto mais alto. A proposta desta segunda parte é ambiciosa mas plenamente cumprida: “deslindar as modalidades da estruturação do desejo e do exercício dos prazeres, os tormentos dos corpos massacrados, martirizados, violentados e, num outro registo, as misérias das vítimas da usura e do acidente, neste século de elaboração da anestesia e do questionamento das antigas representações da dor.” Aqui chegados, a História do Corpo deixou de ser um assunto para meninos – ou meninas. Segue imparável esta colecção.
Outros volumes:
Do Renascimento ao Iluminismo (1)
Do Renascimento ao Iluminismo (2)
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