“Dá Deus nozes a quem não tem dentes”, costuma dizer o povo ao ver muito boa gente deitar pela janela oportunidades de ouro, muitas vezes sem disso sequer se dar conta. No caso de “A Escada Vermelha” (Kalandraka, 2015), livro ilustrado e escrito por Fernando Pérez Hernando, somos apresentados a uma estranha parelha onde uma das partes parece não ter dentes para abrir uma só noz: um pássaro verdadeiramente ingénuo e um coelho tremendamente engenhoso.
Seja qual for o sítio para onde se dirija, o pássaro não abdica de levar, debaixo da asa, uma escada vermelha. Para subir aos telhados, às árvores, às nuvens, e até mesmo à lua. E, também, para descer de todos esses lugares. Isto até ao dia em que o coelho encontra o pássaro sentado num tronco de árvore, de olhar perdido, pois tinha perdido a sua escada. E não é que o engenhoso coelho tem uma solução para o problema?
Indicado para pré-leitores, “A Escada Vermelha” é um álbum esteticamente simples e com desenhos super coloridos, que decorre num ritmo sequencial estabelecendo um jogo mnemónico de avanços e recuos. Alguns dos temas focados são o tamanho dos objectos, as distâncias ou a lateralidade, tudo feito sempre com muito humor.
É também um livro carregado de espírito nonsense e a piscar o olho ao lado absurdo e complicado da vida, reflectido na falta de confiança do pássaro que, ao invés de usar o belo par de asas que a seu lado caminham, prefere o absurdo de carregar uma escada para onde quer que vá. Um pouco como em “Presos”, livro de Oliver Jeffers, onde em vez de usar a escada para subir à árvore e apanhar o papagaio de papel o jovem tentava antes acertar nele com a escada, acabando por perdê-la também. Porque isto de adiar os problemas – ou de fazer da sua resolução um bicho-de-sete-cabeças – tem muito que se lhe diga. Ou, dito de outra forma, muitas formas de o ilustrar.
Sem Comentários