«Então, diz, como é que os dois pombinhos se conheceram? Na última semana, já nos devem ter perguntado pormenores sobre o nosso romance uma dúzia de vezes. Nas outras ocasiões, fomos contando cada vez mais pálidos cambiantes da verdade: Trabalhamos juntos; Encontro às cegas; Cortei-lhe o cabelo; Clube de leitura. Mas agora, encorajada pelo vinho e a rotina, Ivy debruça-se para a frente e diz, numa voz conspiratória: É terrível; sou a melhor amiga da mulher dele.»
E se não fosse possível, a alguém, parar de se perguntar como terá conhecido a pessoa pela qual se sente atraído/a, e que terá visto apenas duas vezes? O que acontece quando duas semanas de paixão louca entre um homem e uma mulher, com muito sexo à mistura, acabam por ditar o resto das suas vidas? A relação entre dois perfeitos desconhecidos, que só conhecem pormenorizadamente as suas partes íntimas – e que acabam por ficar ligados com uma notícia bombástica -, poderá sobreviver nas semanas seguintes?
Andy Jones, escritor inglês com três romances na sua carreira literária, decidiu responder a estas questões no seu mais recente e mais bem-sucedido livro, “Nós Os Dois” (Suma de Letras Portugal, 2016). Fisher e Ivy, ambos trabalhadores na área da publicidade, conhecem-se e em pouco tempo não resistem à paixão que os consome. Durante duas semanas colocam o trabalho de lado e decidem consumar a sua atracção com sofreguidão e sem inibição. Mas, também em pouco tempo, acabam por dar um passo verdadeiramente importante em qualquer relação: Fisher leva o seu novo amor – a sua namorada para todos os efeitos – para conhecer o pai. Ainda sem se conhecerem bem, o passo é maior do que esperavam e acaba por afectar a relação de amor tão precoce. Se tudo parecia perdido, tendo em conta os receios de Fisher, há uma notícia bombástica que acaba por juntar dois namorados quase desconhecidos numa relação amorosa. E, à medida que os meses passam, Ivy e Fisher vão perceber que o tempo é sagrado numa relação.
“Nós Os Dois” é uma excelente narrativa sobre tudo o que não deve ser feito quando se namora com alguém, seja homem ou mulher. Quando as circunstâncias juntam apressadamente duas pessoas, como acontece aos dois protagonistas deste livro, um simples erro pode levar à morte da relação. Se duas pessoas apaixonadas uma pela outra, juntas há tempo suficiente, necessitam de conversar e partilhar os bons e maus momentos, então duas pessoas que mal se conhecem necessitam deste ritual constantemente. E, tal necessidade constante, advém da consequência de duas semanas de amor louco inicial – consequência que é descoberta logo nos primeiros capítulos do livro e que irá, com certeza, deliciar quase todos os leitores. Porém, ao invés de partilharem o que lhes vai na alma, Fisher e Ivy fazem exactamente o contrário: com medo da reação um do outro, acabam por não falar sobre os seus medos ou, em certas alturas, mostrar as suas pequenas revoltas quando começam a passar muito tempo juntos. Um comportamento que, a longo prazo, poderá trazer consequências drásticas.
“Nós Os Dois” é um manual divertido, equilibrado com momentos sérios e mais dramáticos. E, não fossem estes momentos, especialmente reservados para os capítulos finais, poderia ser apenas mais um romance cor-de-rosa. No entanto está um pouco longe dessa simples e, muitas vezes, desprestigiante categoria. O equilíbrio é mantido desde o início com o melhor amigo de Fisher, El, portador da doença de Huntington. Uma doença que, segundo Fisher, começou a dificultar a fala do seu amigo, a paralisar-lhe os músculos, levando-lhe todas as inibições e noções de delicadeza social. Atrás desta doença está o companheiro de longa data, Phil. Se no geral é um romance leve, outros momentos mais sérios que convidam o leitor a alguma reflexão.
Se a fórmula de Nicholas Sparks, amada por tantas leitoras, peca pelo dramatismo fatal reservado para o final de cada livro, este “Nós Os Dois” consegue atingir a perfeição por ser uma narrativa equilibrada, apesar de não lhe faltar também algum drama. Se conseguir juntar novamente a leveza e a seriedade nas próximas obras, tornando-as tão equilibradas quanto este livro, Andy Jones terá com certeza um caminho de sucesso pela frente.
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