Irving D. Yalom, psiquiatra e escritor norte-americano de ascendência russa, apresenta-nos uma compilação de dez histórias verídicas, devidamente alteradas de forma a não expor a identidade dos seus pacientes. Aos oitenta e quatro anos, mantendo-se profissionalmente activo como terapeuta e exercendo a psiquiatria com evidente entrega e paixão, o autor confronta-se e gere sem parcimónia a eminência de um fim.
Em “Criaturas de um dia e outras histórias de psicoterapia” (Saída de Emergência, 2015), convida-nos a acompanhar momentos terapêuticos, demonstrativos da arte e relevância de trabalhar tendo por base evocações, servindo-se da empatia, fiel à aceitação, almofadas em contexto terapêutico mas, igualmente, ensinamentos para o campo das interacções gerais.
Paul, o escritor com um bloqueio de escrita que, aos oitenta anos, procura concluir uma obra começada com menos de trinta; Um escritor que gostava de dançar a valsa com as palavras que encontrou na terapia e no diálogo com o terapeuta a melodia para continuar a dançar; Charles, um executivo bem-apessoado com tudo para triunfar, oprimido pela falta de confiança, recriminações e culpa, com dificuldade em agarrar e desfrutar do presente; Natasha, a dançarina de origem russa que, tendo deixado de dançar há mais de quarenta anos, se serve de uma fotografia em pose de arabesco para se apresentar numa primeira sessão. Ao todo são dez histórias autónomas, reveladoras de interacções com personagens diversas, de uma imensa complexidade de manifestações, posições e desfechos, como grande relevância exploratória e interpretativa.
Um denominador comum em todos os relatos: a necessidade de gerir o desaparecimento temporário e, em alguns momentos, a morte de um elemento significativo, fazendo antever a efemeridade da vida e a eminência de um reverso no planeado; reconhecer e processar a perda, superando o efeito paralisante que lhe está associado e encontrar sentido à continuidade do presente, por muito árduo que surja – eis o desafio.
“A coisa mais importante que eu e qualquer outro terapeuta podemos fazer é oferecer uma genuína relação de cura, da qual os pacientes podem retirar aquilo que necessitam. Iludimo-nos se pensamos que uma ação específica, seja uma interpretação, uma sugestão, uma classificação ou uma reafirmação, é factor de cura.” A simplicidade do terapeuta; a transparência do processo; a demonstração do ganho; o valor da relação; e, por último, nalguns casos, o reconhecimento do cansaço e a dúvida no fim de uma sessão.
A convivência harmoniosa entre a psiquiatria e o romance tem-nos permitido desfrutar de viagens inspiradoras às vivências mais conturbadas dos pacientes que Irving. D. Yalom segue em terapia, servindo ainda como epígrafe em romances inspiradores. “Quando Nietzsche Chorou” (1992), “A Cura de Schopenhauer” (2005) ou “O problema de Espinosa” (2012), já publicados pela Saída de Emergência, são romances que entrelaçam a história e a filosofia, permitindo acompanhar o pensamento e a vivência de cada um dos personagens centrais, bem como a sua transposição para a contemporaneidade pela demonstração do valor da relação na resolução de dilemas e orientação moral. “Criaturas Por Um Dia e Outras Histórias de Psicoterapia” insere-se na linha de “Mentiras no Divã” (1996) e “A Psicologia do Amor” (2011), histórias reveladoras dos processos e bastidores da psicoterapia.
O ensejo para a leitura e a recomendação deste livro remetem para o interesse pela psique humana mas, igualmente, para o desenvolvimento pessoal e a gestão de crises existenciais relacionadas com episódios de perda.
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