Nascido na Colômbia em 1973, Juan Gabriel Vásquez é autor de vários romances, traduções de clássicos da literatura universal e colunista num jornal colombiano. Recebeu também vários prémios pelas suas obras.
O livro “As reputações” (Alfaguara, 2015) foi publicado muito a propósito este ano em Portugal quando, em Janeiro, se tinha dado o atentado ao Charlie Hebdo, jornal semanal satírico francês. Não imaginavam os editores (ninguém, aliás) que fosse haver mais atentados, ainda no mesmo ano e de novo em Paris.
Para defesa do autor, o livro saiu na língua original em 2013, quando o mundo inteiro (ocidental portanto) ainda não tinha sofrido o choque daquele atentado e reeinvendicado em uníssono o direito de pensar ou de se expressar livremente.
A história do romance é a seguinte: Javier Mallarino, que acabou de receber uma homenagem que consagra a sua longa e feliz carreira de caricaturista num jornal colombiano, vai ser confrontado com uma má memória do passado na pessoa de uma jovem jornalista e, por causa desta, questionar-se sobre a legitimidade do seu sucesso professional e a sua ética.
As pessoas apenas o conhecem pelos desenhos que publica há uma vida – e conhecem-no bem. Souberam ao longo dos anos apreciar essa visão do seu mundo, e perceber a força das suas opiniões. A sua vida pessoal ressentiu-se desse trabalho diário de desenhar o que pensava, de denunciar a verdade sobre os homens políticos e a sociedade colombiana.
A relação com a mulher e a filha desintegrou-se com o tempo apesar do seu amor, em parte por causa de ameaças recebidas depois da publicação de desenhos mais polémicos, o que o fez deixar a família, a cidade e o mundo para se retirar numa montanha: “Ele já quase nunca vinha à cidade e habituara-se a olhar o mundo através dos ecrãs e das páginas, a deixar que a vida viesse até si em vez de a perseguir nos seus esconderijos, como se achasse que os seus méritos lhe permitiam tal coisa e que agora, passados tantos anos, era a vida quem deveria procurá-lo”.
Porém, esta cerimónia de homenagem devolve-lhe por uma noite a sua mulher, e resgata do passado as razões pelas quais ele continuou sozinho o seu caminho: “Um aguilhão forrado de mel.A identidade do caricaturista depende das medidas com que misture os dois ingredientes, mas os dois ingredientes terão sempre de lá estar… Não há caricatura se não houver subversão, pois toda a imagem memorável de um político é, por natureza,subversiva:retira o equilíbrio ao solene e denuncia o impostor. Mas também não há caricatura se não houver um sorriso, ainda que seja um sorriso amargo, na cara do leitor…”
Neste estado de graça, no dia a seguir à cerimónia aparece-lhe à porta de casa uma jornalista que o quer entrevistar, que não é senão Samanta Leal, a jovem que foi amiga da filha na infância e que foi protagonista involuntária de uma série de acontecimentos dramáticos que viriam a mudar o rumo de algumas vidas. Um momento do qual vai depender toda a história, seguindo-se uma série de pequenos micro-dramas, narrados como se fossem filmados, no meio de um ambiente nebuloso, provavelmente devido ao fumo e vapores de alcool da festa, e cada um, à vez,focado e aumentado, enfatizando os sentimentos, a confusão e as reacções dos presentes.
Porém, a descrição da confusão que domina e que adivinhamos em poucas linhas é repetida ao longo de várias páginas, não chegando o autor – ou o leitor – a qualquer conclusão. Também o desfecho do romance surge repentinamente, pouco interessante ou coerente, ficando muito aquém dos seus primeiros dois terços, num livro muito bem escrito e que prima pela originalidade do tema.
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