“Um Cântico de Natal” (Fábula, 2024) talvez seja uma das obras mais conhecidas de Charles Dickens, e uma das mais adaptadas ao cinema, à televisão e a outras artes cénicas. A colecção Tesouros da Literatura, da editora Fábula, presenteia-nos com uma edição cuidada e um prefácio, de Maria do Rosário Pedreira, elucidativo sobre a relevância dos mais jovens lerem este livro de Dickens. Um excelente preâmbulo.
Quase duzentos anos depois de ter sido escrito, de se manter em diferentes listas dos 100 melhores romances de sempre, continua nos escaparates e a conquistar leitores. Afinal, o que fará de “Um Cântico de Natal” um tão livro especial?
Charles Dickens apresenta-nos Ebenezer Scrooge, um homem de negócios avarento, pouco simpático, que “trabalhava sem descanso! Um velho pecador, extorsionista, ganancioso, unhas de fome, somítico, mesquinho e invejoso! Duro e afiado como uma pederneira, da qual nenhum aço conseguira alguma vez arrancar um fogo generoso; misterioso, fechado em si mesmo e solitário como uma ostra”.
Rico, indiferente aos outros, Scrooge tinha mais um atributo (não muito comum): não gosta do Natal. Nenhuma das suas atitudes, nem a mais insignificante, comunga com o espírito natalício. Parece-vos estranho? E qual será a razão para tão grande descontentamento?
Muito próximo do dia de Natal, o seu sobrinho desejou-lhe “Feliz Natal!”. Desejo que não lhe agradava, ao que respondeu: “Feliz Natal! Fora com o Feliz Natal! O que é o Natal senão uma época para pagar contas sem dinheiro; uma época para percebermos que estamos um ano mais velhos, mas nem uma hora mais ricos; uma época para fazer o balanço das contas e verificar que cada parcela, ao longo de todos os doze meses do ano, apresenta valores negativos? Se fosse feita a minha vontade (…), todos os idiotas que andam para aí a desejar «Feliz Natal» seriam cozidos com o seu próprio pudim e enterrados com uma estaca de azevinho espetada no coração. Seriam, pois!”. Como conseguia Scrooge ser tão desagradável, tão cruel!
Este personagem envolve o leitor num misto de emoções: se, por um lado, não se aprecia esta desumanidade e desapego por outro, há também uma réstia de esperança de que o seu comportamento se altere. O leitor avança, de forma apressada, na busca de uma razão que esclareça enorme amargura e insensibilidade. Na véspera de Natal, após ter acordado de um longo sono, recebe a visita de três espíritos do Natal Passado, Presente e Futuro. Quem seriam estes espíritos? Porque aparecem neste dia? O que queriam de Ebenezer Scrooge?
Deveremos pensar na família, nos outros, comungar da generosidade apenas nesta quadra natalícia? Será que a conversa com os espíritos obriga Scrooge a (re)pensar os seus actos, a sua forma de ser, de estar, a importância do ter e a questionar-se sobre o que nos proporciona felicidade? Como poderemos partilhar um pouco dessa felicidade com os outros? Será que Ebenezer Scrooge se redimiu dos seus comportamentos estranhos, egoístas e desagradáveis? Um excelente livro para dialogar, para ler em família e, quiçá, fazê-lo na véspera de Natal.
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