Irlanda: berço de contadores de histórias, terra de homens bravos. No imaginário da Ilha Esmeralda encaixam-se os feitos de São Patrício e o talento literário de Swift, Joyce e Wilde, não esquecendo a valentia política de O’Connell ou Michael Collins, nem tão-pouco a popularidade de figuras contemporâneas como Sinéad O’Connor, Conor McGregor ou Bono.
Outro dos ícones daquele país é William Butler Yeats, o eterno porta-estandarte da cultura irlandesa, que imbuiu a sua escrita no espírito da nação e trouxe para casa o Nobel da Literatura em 1923. Considerado um dos escritores mais influentes do século XX, Yeats notabilizou-se pela criação poética e composições dramáticas, bem como pela sua prosa narrativa, que agora se encontra traduzida e compilada em “As Tábuas da Lei – Ficção Completa” (E-Primatur, 2023), uma edição que reúne mais de 25 contos, novelas e um romance biográfico inacabado.
A ficção curta de W. B. Yeats leva-nos numa viagem pela Irlanda esquecida das lendas e castelos. Nela figuram bardos e jograis que habitam pacatas aldeias de estradas poeirentas, muros de pedra e telhados de colmo, ao passo que nos promontórios verdejantes ou nas ermas florestas, feiticeiras e druidas convivem com espíritos, fadas e outros seres sobrenaturais. Até mesmo nas histórias mais naturalistas de Yeats paira uma aura de magia e superstição, que nos encaminha numa inusitada romaria até às antigas tradições irlandesas.
Rica em metáforas e simbolismo, a escrita de Yeats tem o poder de ressuscitar o folclore celta que se havia perdido com o advento da modernidade. Conforme a sua obra poética, a prosa de W. B. Yeats fixa-se na contenda entre os planos material e metafísico, e explora temas como a fé, o amor, a busca de conhecimentos proibidos e a salvação da alma.
Composta por histórias misteriosas e divertidas, alguns contos assustadores e ainda um par de novelas mais convencionais, a “Ficção Completa” de Yeats é um dos projectos editoriais mais relevantes da E-Primatur até à data. Esta edição, que ostenta traduções competentes e esmero na curadoria dos textos que compila, peca apenas pelas notas de rodapé, que se fazem notar pela sua escassez, exigindo do leitor conhecimento dos costumes insulares, geografia e mitologia da Irlanda.
Exibindo como pano de fundo a identidade nacional irlandesa, esta colectânea atribui ainda mais profundidade ao papel do esoterismo na vida e obra de Yeats, especialmente tendo em conta a sua obsessão por sociedades secretas e conhecimentos ocultos, como o rosacrucianismo e a alquimia. Nesse sentido, mais que uma mera colecção de textos, este volume revela a fórmula milagrosa de um autor que separou a religião do misticismo, fermentou ensinamentos antigos, destilou cultura e erudição e, por fim, obteve o ouro literário.
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