Se, em tempos, um crítico do The New York Times falou de “Jonathan Strange & Mr. Norrell” como uma espécie de Hogwarts para adultos, talvez possamos fazer o mesmo em relação a “Livro da Noite” (Topseller, 2023), dizendo que este será qualquer coisa como “O Príncipe Cruel” para gente mais crescida.
Com assinatura de Holly Black, autora que para além da trilogia do Príncipe Cruel já nos brindou – a meias com Cassandra Clare – com As Aventuras de Spiderwick, “Livro da Noite” (Topseller, 2023) foi apresentado como o seu primeiro livro para adultos, e a verdade é que esta trama não é mesmo para miúdos, que se poderão deixar perder neste rebuscado mundo feito de sombras.
No centro desta trama Blackiana está Charlie Hall, com “dedo de carteirista, língua de mentirosa e um coração empedernido”, habituada a não confiar e adepta do modo solitário. Porém, se no mundo da magia da sombra a sua reputação serve como respeitoso cartão-de-visita, no mundo de verdade consideram-na “uma amadora inútil, desejosa de palmas, desejosa de palmar uma aliança de casamento ou recuperar um pitbull raptado”.
Os seus maiores clientes têm sido os crepusculistas, magos capazes de despertar e manipular as sombras, roubando documentos preciosos e participando em esquemas manhosos, mas que lhe valeram a simpática alcunha de charlatã. Porém, no tempo presente Charlie procura manter o trabalho honesto de empregada de bar, o que não tem sido fácil. Sobretudo quando tem um namorado sem sombra que parece esconder algo e uma irmã, vidente telefónica de profissão, a pouco tempo de se tornar uma crepusculista.
Quando dá de caras com uma figura do passado, que julgava estar arrumada no fundo do baú das memórias incómodas, Charlie não tem como não voltar ao activo, entrando numa espiral onde pelo caminho vai travando conhecimento com mágicos obscuros, bilionários com a mania e crepusculistas poderosos, todos tentando jogar a mão ao Livro da Noite, que está entre a lenda, o mito urbano e a Bíblia da magia, que dizem conter o segredo dos segredos.
Holly Black mantém, neste thriller do oculto que segue em modo Velocidade Furiosa, alguns dos elementos dos livros anteriores – uma heroína de pelo na venta, uma trama complexa, uma atmosfera sinistra -, mas há claramente uma subida de nível, numa história sobre trauma e (des)amor que chega a parecer uma reinvenção de Romeu e Julieta. Comparado com O Príncipe Cruel, “Livro da Noite” – que terá um segundo e derradeiro volume – é um livro desarrumado, duro e complicado mas, para quem gosta de fantasia e magia, é sem dúvida uma viagem que vale muito a pena fazer.
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