Por muito que no mercado editorial português não parem de chover policiais, quando chega a hora de destacar os mais brilhantes a escolha não é assim tão difícil. Entre esse punhado de eleitos, capazes de levar o leitor ao lado mais negro e sombrio da alma humana, está o nome de uma autora americana: Karin Slaughter.
Slaughter – só este nome já deixa o leitor com pele de galinha – é responsável pela criação de um dos mais estranhos agentes especiais do mundo da literatura. Para além de apresentar uma calma natural para lá do Xanax, um raciocínio muito acima da média e uma inabilidade tremenda para qualquer tipo de relação ou contacto humano, o agente especial Will Trent guarda a sete chaves um segredo que, se descoberto, fará com que tenha de trocar a vida de agente da lei pela de virador de hambúrgueres: é disléxico num grau bastante considerável.
Em “Génesis” (Topseller, 2015), o terceiro livro da série Will Trent, este terá novamente como parceira Faith Mitchell, com quem havia começado com dois pés esquerdos – basta resumir dizendo que foi ele o responsável pela reforma compulsiva da mãe de Faith com a suspeita de corrupção. Faith que, nesta história, está grávida e com diabetes, o que leva Amanda, a glacial e severa chefe de ambos, a descrever de forma superior esta estranha e mais do que improvável dupla: “Um pateta disléxico com um problema de temperamento e uma diabética gorda e fértil a quem faltam conhecimentos rudimentares de controlo de natalidade!”
A história começa com o atropelamento de uma jovem, nua e com sinais de ter sido abusada e torturada de forma brutal. A rapariga será tratada por Sarah Linton, uma antiga médica-legista que, três anos antes, se havia mudado para Atlanta na tentativa de deixar para trás um passado trágico.
Quando Will Trent se dirige à cena do acidente, tendo de enfrentar as habituais lutas pela jurisdição e um bando considerável de idiotas, descobre uma câmara de tortura enterrada na terra, guardada por ratazanas e cenário de múltiplos horrores.
Conseguindo arrancar a investigação das mãos do chefe da polícia local, Will e Faith – e uma intrometida Sarah Linton – dedicar-se-ão à caça do assassino, que parece seguir uma espécie de padrão: mulheres bonitas, independentes, bem-sucedidas, de olhos e cabelos castanhos, que não têm amigos ou alguém que goste delas. Quando o caso parece perdido, uma estranha e críptica frase chega paradeitar alguma luz sobre o caso: “Não me negarei.”
Uma vez mais Karin Slaughter tece uma história complexa e com uma tremenda dinâmica, balançando entre o lado sinistro e dramático da vida, com personagens bem desenhadas às quais a narrativa vai conferindo avanços mas também retrocessos. Para além de um apurado trabalho ao nível forense e da instalação de um estado de terror que permanece ao longo da narrativa, Slaughter tem uma notável habilidade na forma como apresenta os dramas pessoais e dilemas de cada personagem, sobretudo dos dois protagonistas da série. Dupla para lá do improvável, Will Trent e Faith Mitchell são do que melhor aconteceu ao policial dos tempos modernos.
2 Commentários
Queria muito esse livro e não encontro. É em português do Brasil?
Obrigada!
Olá, boa tarde. Não, é em português de Portugal.