Crescemos a ouvir as histórias de quem nos rodeia e de quem amamos, herdamos as suas memórias e guardamo-las junto ao peito, como se fossem também elas nossas. A prova disso é esta pequena grande obra da Marcador, em que Clarissa Pinkola Estés nos comove com o relato de momentos outrora vividos pelo seu tio Zóvar – jardineiro, camponês, refugiado, contador de histórias e, acima de tudo, uma pessoa cheia de fé.
Nesta obra autobiográfica, pessoal até ao tutano, a autora relembra as histórias que o seu tio húngaro lhe contou, e reconta-as com uma simplicidade tocante. No fundo, “O Jardineiro que tinha Fé” (Marcador, 2023) é uma ode a todos aqueles que, apesar das situações mais adversas, valorizam as mais pequenas coisas da vida, escolhendo ver o copo meio cheio todos os dias.
O tio Jóvar muda-se para a casa da autora para fugir à guerra, à fome e à morte. O seu aspecto físico contrasta com a vivacidade da sua alma. Embora tenha presenciado diversas situações trágicas, horrendas e desumanas, acredita que tudo o que viveu não foi em vão, que tudo tem um propósito e que tudo pode, igualmente, ser vencido com amor e compreensão. À sua sobrinha passou este tio muitos saberes, a sua persistência e a sua esperança.
Nesta homenagem ao seu tio, Clarissa Pinkola Estés prova que os males de que padece o mundo também podem ser poéticos, que a vida é efémera e que nos cabe a nós escolher viver em paz, ao invés de nos entregarmos ao mal que nos rodeia e atormenta. Somos nada mais do que sementes da vida, regadas por quem connosco priva. Todas as árvores têm as suas especificidades, sendo isso o que as torna especiais, e é portanto necessário que sejam plantadas em solos adaptados às suas condições para darem frutos. Nós, Homens, somos iguais e só damos frutos, quando nos encontramos felizes, livres e respeitados. Não é a queda da folha que mata a árvore, não é a mudança que nos corrói: é a inércia que nos mata.
Sem Comentários